PERSONAGENS:
O AMIGO
FREDERICO
ÂNGELA
GARÇOM
CENÁRIO:
Mesas espalhadas na calçadas na frente do bar. O AMIGO de FREDERICO toma cerveja sozinho e tranqüilamente. Veste-se com um jeans básico.
O Amigo está fumando quando FREDERICO ENTRA. Ele senta-se imediatamente numa cadeira e coloca uma pasta de executivo noutra cadeira vazia.Frederico está de terno desalinhado, com a gravata frouxa.
Cena 1.
FREDERICO
Você já bateu em mulher?
(Frederico coloca a pasta em outra cadeira vazia a seu lado. O Amigo levanta o braço acenando para o Garçom).
O AMIGO
Garçom, mais uma bem gelada. Mais um copo também.
(Frederico aproxima-se mais do Amigo).
FREDERICO
Você já bateu em mulher?
(O garçom atende um freguês numa mesa distante.O Amigo torna a levantar o braço, ASSOVIA).
O AMIGO
Essa cerveja vem ou não vem. Traga também um cinzeiro e mais um copo.
GARÇOM
Já está saindo.
O AMIGO
Você viu que jogaço ontem. Este ano não tem para o Mengo, para o Bota, pra ninguém. Quatro a zero.
FREDERICO
Você já bateu em mulher, na sua mulher!
(O amigo acende um cigarro).
O AMIGO
Não. Nunca bati em mulher, porra! Que pergunta, poxa!
(O garçom ENTRA, serve a cerveja e coloca o cinzeiro na mesa).
GARÇOM
Mais alguma coisa?
(Frederico faz um sinal com a mão indicando que não. O Garçom SAI. Frederico treme ao segurar o copo e ao tomar de um trago só o copo de cerveja.O copo fica vazio. O Amigo serve-lhe outro copo).
FREDERICO
Me ajude, cara. Estou ficando maluco.
O AMIGO
Você não vai à missa todo domingo. Procure o padre. Eu não sou bom em conselhos.Tenho a vida torta com a mulherada. Você sabe. Não sou bom exemplo para nada.
FREDERICO
Padre? O que um padre pode saber de mulher?
O AMIGO
Nem te digo. Alguns sabem até demais. Outros se dedicam a crianças e adolescentes. Tarados e beatos. Que nojo! Mas mudando de coelho pra pato. Não sendo conversa de corno, coisa que eu sei que você não é, pois boto a mão no fogo pela Ângela, pode desembuchar, então.
FREDERICO
Pois é a Ângela. Estou com ela há dez anos e me convenci de que nunca a conheci de fato...
(Frederico procura cigarros nos bolsos).
FREDERICO
...Dá um dos seus. Os meus acabaram...
(O amigo dá a Frederico um cigarro e o acende).
FREDERICO
...Vivi todo esse tempo com uma estranha. Semana passada fomos à festa dos Castro. Você também estava lá, lembra.
O AMIGO
Festa chata pra burro. Nunca vi tanto velho junto. Parecia baile da terceira idade. Os fisioterapeutas devem ter ganhado uma nota no dia seguinte. Tinha um lá que não agüentava nem com ele mesmo e foi dançar. Não tenho nada contra velho, mas uns tem que saber a hora de pendurar as chuteiras. Patético. Mas o Uísque era bom. Nem deu dor de cabeça.
(O Amigo levanta a garrafa vazia e ASSOVIA para o Garçom).
FREDERICO
Saímos da festa ainda cedo.
O AMIGO
Eu também saí cedo. Uma velhinha, que por sinal acompanhava o velhinho dançarino, vestida de mocinha, começou a dar mole pra mim. Ela devia ter a idade da minha avó. Imagina como ficou a minha auto-estima. Não suporto mulher assanhada, ainda mais com a cara da minha vó.
FREDERICO
Ângela é que insistiu para que saíssemos cedo. Bebi o de sempre, nada além da conta. Mas Ângela exagerou. Foi a primeira vez em que a vi bêbada. Começou a falar mole. Não tem nada mais irritante do que uma mulher bêbada.
O AMIGO
Mulher bêbada e velha assanhada. Onde vamos chegar?
FREDERICO
No carro, minha mulher estava irreconhecível. Queria porque queria ir a um motel.
O AMIGO
E você achou ruim. Está certo que ir com a própria mulher para o motel não tem muita graça. Algo assim como beijar a irmã, mas isso quebra a monotonia. Isso quebra. Ah, se quebra.
(O Amigo dá um tapinha nas costas de Frederico).
O AMIGO
Grande Frederico, garanto que o desempenho foi nota dez.
FREDERICO
Não brinque. É sério. Ela queria porque queria. Tive que levá-la. Você me conhece. Nunca fui num lugar desses. Ela preparou tudo. Endereço do lugar – acho que ligou antes até - uma sacola com suas coisas. Tudo.Deus me livre, mas tenho quase certeza de que se eu não fosse, ela sairia com qualquer um que quisesse ir a um motel. Dá mais um cigarro...
(Frederico traga a fumaça do cigarro, a solta e fica por um tempo a observá-la).
FREDERICO
...Confesso que até hoje não entendi nada daquilo. Do que Ângela realmente queria. Sei que todo mundo me acha pão duro. Mentira, quando o assunto é minha família sou mão aberta pra cachorro. Mas, para mim, transar em casa ou em qualquer outro lugar dá na mesma. E em casa não é só mais barato, é cômodo, prático mesmo; e depois, é só virar de lado e dormir.
O AMIGO
Não precisa nem levantar... Pegar o carro, enfrentar o caminho com sono. O governo deveria fazer uma campanha de trânsito assim do tipo “transe em casa” e evite acidentes.
FREDERICO
Vou lhe contar tudo em detalhes, para que você entenda meu desespero. Foi assim:
CENÁRIO:
A decoração, embora almejando certo luxo, abusa de cores fortes. A cama está logo na entrada, perto um bar com garrafas de bebidas e taças.
CENA 2.
(ÂNGELA ENTRA arrastando FREDERICO pelas mãos. Ela está com um vestido dourado de festa e carrega uma bolsa e a sacola. Frederico está com um terno escuro.A porta fica aberta. Ela abraça Frederico).
ÂNGELA
Frederico, você ainda me ama?
FREDERICO
Ângela, o que deu em você criatura?
ÂNGELA
Sabe quanto tempo faz que a gente não transa?
FREDERICO
Esses dias a gente transou.
ÂNGELA
Ângela, faz dois meses já.
FREDERICO
Não faz tanto tempo assim.
ÂNGELA
Faz sim.
FREDERICO
Mas semana passada, não lembra?
ÂNGELA
Aquilo não conta, você quase dormiu em cima de mim. Não tirou nem o pijama...
(Ângela puxa para baixo a parte superior do vestido, os peitos ficam nus. Pega nas mãos de Frederico e as puxa para os seus peitos).
ÂNGELA
...Pega. Veja, sou mulher. A sua mulher. Esqueceu?
(Frederico empurra Ângela).
FREDERICO
Você está bêbada.
(Ângela começa a chorar e a gritar. E pega uma TAÇA DO BAR e a quebra jogando-a contra a parede).
ÂNGELA
Bêbada? Eu estou puta. Puta com esta vidinha besta que você me obriga a levar. Preciso de prazer. Lembra o que é prazer?
(Ângela soluça e chora.Frederico lhe dá um tapa no rosto. Ela se apóia na cama, não chega a cair e retoma o equilíbrio. Ela agarra Frederico pelo colarinho e o sacode).
ÂNGELA
Isso Frederico, bata mais...
(Frederico fica imóvel ainda seguro pelo colarinho).
ÂNGELA
...Bata mais, seu cachorro.
(Frederico, ainda indeciso, levanta a mão para bater em Ângela.Ele acerta o rosto de Ângela que cai no chão. Ângela rindo estirada no chão).
ÂNGELA
Me bata seu cachorrão. Me bata mais.
(Ângela levanta-se).
CENAS EM SEQÜÊNCIA:
A)Frederico dá mais um tapa em Ângela.
B)Ela cambaleia.
C)Ele rasga o restante do vestido.
D)Ele dá tapas que pegam em várias partes do corpo de Ângela
E)Tapas na bunda de Ângela
F)Frederico abaixa suas calças até os joelhos.
G)Eles transam no chão do quarto.
CENÁRIO:
O mesmo cenário da Cena 1.
Cena 3.FREDERICO
Fizemos amor ali mesmo no chão do quarto. E pela primeira vez, em dez anos, Ângela não pediu para apagar a luz.
(O Amigo gargalha).
O AMIGO
Porra, cara, é só isso. Você devia estar contente. Está preocupado à toa. Aliás, não vejo razão nenhuma para você estar assim, desse jeito. Fantasia de mulher. Tudo vai ficar bem.
FREDERICO
Bem nada. Foi nesse dia que começou a minha desgraça.
O AMIGO
Que desgraça, rapaz?
FREDERICO
Desculpe, mas me dá mais um cigarro. Os meus acabaram e aqui não tem para vender.
(O amigo dá a carteira de cigarros para Frederico).
O AMIGO
Toma, fume quanto quiser, tenho mais um maço no carro.
(Frederico acende o cigarro).
FREDERICO
Obrigado. Desde aquela noite no motel, depois da surra, a minha mulher anda radiante. Comprou roupas novas, Está fazendo regime para emagrecer. Pega filme pornográfico na locadora para assistir e mandou as crianças para passarem as férias na casa da avó.
O AMIGO
E você não está gostando?
FREDERICO
Como posso gostar? Você sabe da minha educação. Fui educado na sacristia, sou um homem direito. Um homem honesto e de fé. Ângela está em pecado ao agir desta maneira. Sexo para nós, pelo menos para mim, sempre foi pecado. Ângela também foi educada assim. Era linda, nunca tinha sido tocada, casou virgem, tenho certeza. Não sei o que loucura deu nela. E o pior você ainda não sabe...
(Frederico toma um longo gole de cerveja e limpa a boca com o punho da camisa).
FREDERICO
...Não consigo mais dormir com minha mulher. Peguei um certo receio dela depois daquela noite. Estou dormindo na sala.
O AMIGO
Que bobagem.
FREDERICO
Sem querer ofender meu amigo, pode ser bobagem para você que está acostumado com essas mulheres mais saidinhas. Não lhe culpo, você é divorciado, pode se dar a esses luxos. Mas Ângela é mãe dos meus filhos. Olha, já tentei o diabo para esquecer de tudo e me aproximar dela novamente, mas não consigo. Aquela não é Ângela, é uma vagabunda qualquer. É o demônio.
CENÁRIO:
Escritório de engenharia com uma mesa antiga com um moderno computador sobre ela, ao lado uma CAIXA DE LENÇOS DE PAPEL e TELEFONE. CADEIRAS. Prancheta de desenho e maquetes de prédios sobre outra mesa. O Amigo está de camisa branca e gravata solta no colarinho.
Fizemos amor ali mesmo no chão do quarto. E pela primeira vez, em dez anos, Ângela não pediu para apagar a luz.
(O Amigo gargalha).
O AMIGO
Porra, cara, é só isso. Você devia estar contente. Está preocupado à toa. Aliás, não vejo razão nenhuma para você estar assim, desse jeito. Fantasia de mulher. Tudo vai ficar bem.
FREDERICO
Bem nada. Foi nesse dia que começou a minha desgraça.
O AMIGO
Que desgraça, rapaz?
FREDERICO
Desculpe, mas me dá mais um cigarro. Os meus acabaram e aqui não tem para vender.
(O amigo dá a carteira de cigarros para Frederico).
O AMIGO
Toma, fume quanto quiser, tenho mais um maço no carro.
(Frederico acende o cigarro).
FREDERICO
Obrigado. Desde aquela noite no motel, depois da surra, a minha mulher anda radiante. Comprou roupas novas, Está fazendo regime para emagrecer. Pega filme pornográfico na locadora para assistir e mandou as crianças para passarem as férias na casa da avó.
O AMIGO
E você não está gostando?
FREDERICO
Como posso gostar? Você sabe da minha educação. Fui educado na sacristia, sou um homem direito. Um homem honesto e de fé. Ângela está em pecado ao agir desta maneira. Sexo para nós, pelo menos para mim, sempre foi pecado. Ângela também foi educada assim. Era linda, nunca tinha sido tocada, casou virgem, tenho certeza. Não sei o que loucura deu nela. E o pior você ainda não sabe...
(Frederico toma um longo gole de cerveja e limpa a boca com o punho da camisa).
FREDERICO
...Não consigo mais dormir com minha mulher. Peguei um certo receio dela depois daquela noite. Estou dormindo na sala.
O AMIGO
Que bobagem.
FREDERICO
Sem querer ofender meu amigo, pode ser bobagem para você que está acostumado com essas mulheres mais saidinhas. Não lhe culpo, você é divorciado, pode se dar a esses luxos. Mas Ângela é mãe dos meus filhos. Olha, já tentei o diabo para esquecer de tudo e me aproximar dela novamente, mas não consigo. Aquela não é Ângela, é uma vagabunda qualquer. É o demônio.
CENÁRIO:
Escritório de engenharia com uma mesa antiga com um moderno computador sobre ela, ao lado uma CAIXA DE LENÇOS DE PAPEL e TELEFONE. CADEIRAS. Prancheta de desenho e maquetes de prédios sobre outra mesa. O Amigo está de camisa branca e gravata solta no colarinho.
CENA 4.
(O TELEFONE TOCA. O Amigo atende).
O AMIGO
Oi, diga Nanci...Quem?...Dona Ângela...Mande entrar.
(O Amigo ajeita a gravata e arruma o cabelo.
Ângela ENTRA. Ela é loira e veste uma saia muito curta. O amigo levanta-se e vai recebê-la na porta).
O AMIGO
Ângela, que surpresa. Vai querer construir uma nova casa? Para você e Frederico faço o projeto de graça.
ÂNGELA
Infelizmente, não?
(Ângela começa a chorar.O amigo arruma uma cadeira em frente a sua mesa. Ângela senta-se.Ela cruza as pernas).
O AMIGO
O que aconteceu?
Ângela aumenta a intensidade do choro. O Amigo empresta o lenço para Ângela e olha para as pernas cruzadas dela.
ÂNGELA
O Frederico sumiu.
(Ângela descruza as pernas e apanha mais um lenço de papel sobre a mesa sem deixar a cadeira. No movimento a calcinha aparece sob a saia. O Amigo observa, pede licença e caminha para um canto do palco).
O AMIGO (Só.)
Frederico tinha razão. Isso é uma tentação do demônio. Que pernas, que pernão. Não deixa disso. O Frederico é gente boa, tem filhos, não vá fazer besteiras... Seu safado.
(O amigo volta para a sua mesa).
ÂNGELA
Há uma semana, na sexta-feira, ele chegou em casa muito nervoso, pegou uns trocados que eu guardo numa caixinha e disse que estava saindo para comprar cigarros.
O AMIGO
Na sexta-feira passada?
(Ângela soluça).
ÂNGELA
Sim e é por isso que estou aqui. Disseram-me que vocês estavam juntos no bar tomando cerveja.
O AMIGO
Horário de Verão. Sabe como é, dia quente, temos que aproveitar.
ÂNGELA
Vocês estavam juntos?
O AMIGO
Sim, tomamos algumas cervejas.
ÂNGELA
E você não sabe para onde o meu marido foi.
O AMIGO
Não. Ele tomou cerveja, conversamos um pouco e eu pensei que ele fosse depois para casa.
(Ângela torna a chorar).
CENÁRIO:
O mesmo da Cena 1.
O AMIGO
Oi, diga Nanci...Quem?...Dona Ângela...Mande entrar.
(O Amigo ajeita a gravata e arruma o cabelo.
Ângela ENTRA. Ela é loira e veste uma saia muito curta. O amigo levanta-se e vai recebê-la na porta).
O AMIGO
Ângela, que surpresa. Vai querer construir uma nova casa? Para você e Frederico faço o projeto de graça.
ÂNGELA
Infelizmente, não?
(Ângela começa a chorar.O amigo arruma uma cadeira em frente a sua mesa. Ângela senta-se.Ela cruza as pernas).
O AMIGO
O que aconteceu?
Ângela aumenta a intensidade do choro. O Amigo empresta o lenço para Ângela e olha para as pernas cruzadas dela.
ÂNGELA
O Frederico sumiu.
(Ângela descruza as pernas e apanha mais um lenço de papel sobre a mesa sem deixar a cadeira. No movimento a calcinha aparece sob a saia. O Amigo observa, pede licença e caminha para um canto do palco).
O AMIGO (Só.)
Frederico tinha razão. Isso é uma tentação do demônio. Que pernas, que pernão. Não deixa disso. O Frederico é gente boa, tem filhos, não vá fazer besteiras... Seu safado.
(O amigo volta para a sua mesa).
ÂNGELA
Há uma semana, na sexta-feira, ele chegou em casa muito nervoso, pegou uns trocados que eu guardo numa caixinha e disse que estava saindo para comprar cigarros.
O AMIGO
Na sexta-feira passada?
(Ângela soluça).
ÂNGELA
Sim e é por isso que estou aqui. Disseram-me que vocês estavam juntos no bar tomando cerveja.
O AMIGO
Horário de Verão. Sabe como é, dia quente, temos que aproveitar.
ÂNGELA
Vocês estavam juntos?
O AMIGO
Sim, tomamos algumas cervejas.
ÂNGELA
E você não sabe para onde o meu marido foi.
O AMIGO
Não. Ele tomou cerveja, conversamos um pouco e eu pensei que ele fosse depois para casa.
(Ângela torna a chorar).
CENÁRIO:
O mesmo da Cena 1.
CENA 5.
(O Amigo está tomando uma cerveja e fumando sozinho na mesma mesa. Ele está de bermudas, sandálias e camiseta).
O AMIGO (Só.)
Hoje está fazendo um ano que Frederico sumiu. Procuramos por ele até em necrotérios e asilos para alienados. O cara tomou chá de sumiço mesmo. Vai ver está fora do país, ou morreu como indigente. Quem sabe?
(Ângela ENTRA com uma saia curta e blusa decotada. Usa óculos escuros e está com uma sacola de compras. Ela beija e abraça o Amigo e senta-se ao seu lado).
ÂNGELA
Eu achei umas algemas e um chicotinho no sex shop. Veja que lindinho...
(Ângela tira os objetos da sacola).
ÂNGELA
...E o baby-doll que forma um conjuntinho lindo com o sutiã e a calcinha. Tudo rendado. Tem uma máscara também, você nem vai acreditar.
FIM
Copyright © 2005 by José Fernando Nandé
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