segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Cantiga do Andarilho


Depois de andar muitas léguas
Na vida feita de dor
Sinto meu peito cansado,
Na boca um amargor
Do que ficou engasgado
E me deixou em pavor.

Ai, ai meu Deus, cruz em credo!
Acode-me Virgem Maria
Dos males que vi no mundo,
Angústia que aparecia
No choro que amargurava,
Na poeira que eu comia!

Eu venho de muito longe,
Lá de trás daquela serra,
Em poucos eu vi bondade;
Gente que por gosto erra
Para causar sofrimento
Nos que vivem nesta Terra.

E é por isso que digo
Agora e sem a escola,
A vida é um tormento,
Inferno que apavora,
Mesmo ao que vive direito
A desgraça o namora.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Os deuses comem pipoca


É, meu amigo, quem pagou
Para nos aplaudir neste circo
Em que nos matamos por nada?

Ergue tua adaga para o firmamento.
Vê: os deuses riem de ti e de todos...
E bocejam e se enfadam, enfastiam-se
Perante nosso sofrimento.

A diversão neste circo é sempre garantida
Porque vivemos para o deleite das deidades!

Os que vão morrer vos saúdam!

Puxa da espada
E aponte para meu coração
Que ele só e sangrando
Pode te dizer da beleza
Deste sacrifício na arena
Em que te arrancarei os olhos
Para glória e riso dos deuses.

Riem os deuses comendo pipoca
Ao verem o picadeiro em que tu morres.

Ri, meu amigo, aproveita teu próprio fim,
Ri, meu amigo, tal espetáculo exige riso.
Ri, ri, ri muito até morrer no riso
Porque na vida
Há uma entrada que também é saída
E há uma saída que é somente isso
Saída.

Ao nascer chegamos chorando,
Ao morrer somos dos deuses o riso.

Do que riem os deuses
Neste espetáculo
De fim tão repetido e sórdido?

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Moda da garrafa pequena


Minha saudade é grande
E a garrafa é pequena.
Por mais que a gente cante
Mais o coração pena. (Estribilho).

Viver sem você não sei,
Seu amor me envenena,
Mas foi o que procurei
Na vida que me condena.

Tenho o peito amargurado
E faço aqui a cantilena
Dos que sofrem calados
Por falta duma morena.

Quem pelo amor não sofre
À morte em vida acena.
O cabra tem que ser forte,
Uma tábua que não empena.

Hoje choro de saudade
De seu cheiro de açucena;
Hoje canto a vontade
Do perfume da  morena.


quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Miguelina


Não sei, Miguelina,
Tu moras muito longe,
Em Santo Domingo,
Na República Dominicana,
Acho que não vou não,
Tenho medo de avião!
E depois, paixões
Se fortalecem na distância.
Quero-te forte, Miguelina,
Em meu peito, Miguelina!
É que, quando apaixonados
Nos sentimos humanos!
Por isso, quero ir não,
Tenho medo de avião
E outras modernidades.
Tenho medo de cair do céu,
Tenho medo de te perder,
Tenho medo de me fazer
Vazio, em desumanidade!


quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Meus braços


Meus braços
Que um dia te estreitaram
Em apertados
Abraços e em desespero
Ao sentirem-te
Em definitiva partida,
Hoje fazem-se cansados,
Atarefados
Que estão
Em carregar toneladas
De vazios,
Saudades e ausência.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Perdoem-me as árvores


Enganei-me, boa amiga,
Tenho que reconhecer...
Há muita impotência nisso,
Sentimento de ter falhado,
De ter perdido tempo
Buscando alucinações.
De longe,
Era bela, sei disso,
Era paixão, sei disso,
Era o que não era
E, hoje, sei disso.
De perto,
Era vazia,
Superficial,
Tão sem sal.
Enganei-me, atenciosa amiga,
Investi no perdido,
Naquilo que não tinha solução,
Movido por tacanho desejo
E com grandes esperanças
De estar enganado.
Uma luta inglória, perdida,
Em que se comete crimes
De lesa-humanidade!
Imagina, minha amiga,
Por amor, cheguei a elogiar
Os sofríveis versos
Que ela dizia escrever,
Ruins e infantis.
Fui covarde no engano, amiga,
E condenei muitas árvores
Ao incentivar tanta mediocridade
Em pilhas de papel.
Enganar-me até podia,
Mas as árvores perdidas...
Para isso não há piedade.




Segredos

Somos o segredo do Sagrado
Guardados no segredo da vida.
Sim, fomos feitos com almas
Para o compadecimento e perdão.
Porém, isso esquecemos
E usamos nosso poder de criar
Para erguer altares às deidades
Sem espírito e materiais.
Por isso, em falsidade,
Contritos rezamos,
Genuflexos oramos
E em segredo deixamos
Escondidos, inconfessos,
Nossos horrendos pecados.




segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Callas ao vento


Segue o dia triste  na ária de Callas,
Uma nota constante, trêmula,
Cantou nossa manhã,
E outra, mais grave,
Compõe a tarde a calar-nos.

Callas sopra ao vento sua dor
E de seu coração foge a voz
Dos amantes miseráveis
Que por este mundo vagam
Até o último e fatal passo.

Doidos e inconsequentes,
Sabemos que amar é andar
Sobre brasas, porém contentes,
Ouvindo na tristeza de Callas
O destino de quem amor sente.



domingo, 20 de fevereiro de 2011

Amor na ponta da língua


Moderninha, moderninha,
Ela me vinha e pedia-me
Provas de amor em inglês,
Língua da moda,
Língua do cinema,
Língua do sistema
Em lençóis polares.

Disse a ela, por Deus, disse:
"I love you" é ridículo,
Sem sal, bárbaro, artificial,
Pior do que isso só existe
O "Ich leabe dich" dos alemães,
Que aos nossos ouvidos é espirro!

Prefiro mesmo o amor latino
No ardente "Te quiero" dos espanhóis,
No delicioso "Je t'aime" francês,
No profundo "Eu te amo" português,
No delirante "Ti amo" italiano
E para não ferir a gramática,
Com oblíquos no início do verso,
Amar-te-ei como os antigos romanos:
"Te amo mea dea! Mea insania te amo!"
Em frenesim, direto e na ponta da língua!

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Zênite

Um sábado colorido
De luzes profusas
E imagino, agora,
Em que estrela
Ficaste dormindo.

Vai este dia de luz,
O Sol é no zênite,
E tu ainda dormes
Abandonada na noite
Que nunca termina.

Quiseste, desejaste,
A solidão da escura laje,
Com os punhos rasgados
E o coração retalhado
Pelo punhal da insanidade.

Deixaste-me neste castigo
De ver todos os sábados
De luzes resplandecentes,
Porém sempre ausentes
Das luzes dos olhos teus.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Horror ao nada


O amor está no mundo
Em oposição ao tédio.
O ódio está no mundo
Em oposição ao tédio.

Temos horror ao tédio,
Horror ao vácuo n'alma,
Ao vazio do não sentir;
Horror de não sentir nada.

Mostra-me um homem
Sem amor ou sem ódio
Que eu te mostrarei ali
Um cadáver que anda.

Se tu amas, contenta-te,
Pois és vivo,
Se tu odeias, conforma-te,
Pois és vivo.

Mas se nada disso te ocorre,
Se o respirar te ilude,
Vai ao cartório próximo e pede
Tua certidão de óbito.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Meu nome, teu nome


Temos esta mania de dar nome às coisas
Para a coisa ter uma existência em nós.
A compreensão começa pelo nome,
Mesmo daquilo que não temos em juízo.

Meu amor te chamo e assim teu amor
Em mim existe porque tem um nome
Que me lembra todas as singularidades
Possíveis no humano ato de amar.

Ouço os pássaros cantantes, é o teu nome,
Ouço uma leve canção de Brel, é o teu nome,
Ouço tua voz suave nesta manhã, é o teu nome.

Percebo tua respiração e sinto que vives em mim.
És tão necessária para lembrar-me vivo, existente,
Porque sem ti e teu amor sou coisa sem nome.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Lingerie jalne


Doce tolice feminina é desejar nossa atenção em tudo:
"Cortei o cabelo e você não disse nada!
"Estou com um sapato novo e você nem notou!
"Usei lingerie preta e jalne e você ignorou!".
Ora, ora, como observar detalhes dos adereços
Se a nossa atenção está sempre no conteúdo!?

Pobres de nós, ó amantes viventes,
Pois amar muito e mais e sempre
Nunca será o necessário e suficiente
Para elas que eternos elogios almejam
Aos enfeites que ao amor dão e desejam!

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Sandra da Luz foi com as águas


Toda morte é estúpida,
Embora algumas se apresentem
Em elevado grau de estupidez.

Ontem choveu muito
E Sandra da Luz morreu afogada
No meio de uma enxurrada.

Seus onze anos de vida
Foram insuficientes para lhe darem
Forças contra a estúpida morte.

Saía da escola e foi arrastada pelas águas,
Sua amiga se salvou, ela seguiu para apagar-se
E seu corpo ficou horas esperando resgate.

Há responsáveis, estúpidos irresponsáveis?
Sempre há, mas nunca alcançados pela Justiça.
Tudo ficará por conta do acaso e fatalidade.

São os maiores assassinos da humanidade,
Acaso e fatalidade, os entes do além
Que estão por aí para isso mesmo,
Matar impunemente, estupidamente
E dar conforto aos verdadeiros assassinos.

Hoje uma menina, amanhã duas,
Depois uma família inteira, mil...
Como os números numa estatística
Servem bem aos estúpidos burocratas
Que ignoram a vida!



segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Mosaico

Tento juntar tua face num mosaico,
Pedra por por pedra, caco por caco,
Lembrança após lembrança,
E tua imagem é disforme.
Esqueci de ti, de como eras?
Não, por certo não,
É que teus pedaços são dores
E as dores quando juntadas
Sempre distorcem o rosto
Que na grande dor se forma.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Teus vinte anos


Há noites que brilham...
Um acordeon, vinho,
Um cantor decadente,
Um veterano piano,
Uma mesa no canto escuro
E tuas brancas mãos
Descrevendo luares no ar...

Explicavas a ti mesma
Teu entendimento de ti
E eu, velho boêmio,
Ouvia-te apenas,
Misturando tuas esperanças
Com a música de Aznavour:
"Je vous parle d'un temps
Que les moins de vingt ans
Ne peuvent pas connaître
".

Ah, minha querida,
Onde encontraste tanta vida
Em teus vinte anos ainda?


sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Infovia do Paraíso


Eu já confessei os meus pecados
Usando um programa de computador,
O telefone celular, ou telemóvel.
Mas o Bento, benedictus pater,
Diz que isso não pode,
É muito moderno
E que o velho esquema
De confessionário é o que vale.
Desculpem-me Deus e meus santos
É que eu não sabia
Que o Vaticano estava sem crédito
Na telefonia, na mensagem de MSN,
No torpedão e nos cabos que nos guiam.
Dante foi ao Céu de barco,
Eu queria ir de e-mail, post
E redes sociais.
Desculpe-me aí, ó meu,
Se não rola uma fibra óptica
Na infovia do Paraíso.
Fiquem espertos,
Pois o Maligno,
Que é um cara antenado
E tem um modem acelerado,
Uma máquina da Aplle,
Fruta de Adão, Eva e o ócio,
Com programas da Microsoft,
Linux, software livre,
Aceita qualquer negócio,
Até virus de computador
De quem é inventor, pai e avô!



Evoé, Orion!


Vou me mandar para Orion,
Nosso bar celeste
Nebuloso e cheio de álcool.
Serei servido pelas ninfas
Divinas e mui guapas,
Puxarei conversa com Baco,
Quero saber quem fez tudo isso
E por que outro mundo não faz
Menos infeliz e mais sensato.
Brindarei com o velho beberraz,
Que ninguém leva a sério,
Pois, tem a vida numa festa eterna:
Os miseráveis mortais vos saúdam,
Saúde aos deuses tediosos! Evoé!!
Saúde, se é que precisais dela!!!

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Perfume barato

Mas em jura de mulher
Quem crerá, se elas não creem?
(Camões)


O teu desejo é tão volátil
Quanto o teu perfume barato.
Abomina-me tua dissimulação
Que engana a ti somente.

Confio em ti desconfiando.
Amo-te tanto e vou odiando
O perfume que se acaba
E deixa o aroma no frasco.

Toda paixão, e que é só paixão,
Definha na mesma proporção
Em que nos vem e aparece.

Sabia disso quando te conheci,
Mas, o embriagado perde a razão
E ao beber de ti, dele se esquece.



quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Saudades de ti


Sim, doce amiga, a infância
Vai comigo,
Assim como nossa inocência
Também vai.
Caminhar nossos pés nos obrigam
Sem piedade
E os naturais distanciamentos
São caminhos,
São caminhos da saudade.
Tão distante estás, minha amiga,
Tão longe...
Mas a lembrança não tem distância,
De ti estou perto,
Tão perto quanto a luz da claridade.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Credo

Creio em ti
Porque tu és meu semelhante
Creio em ti
Porque tu comes do amargo pão
Creio em ti
Porque tu amas, gostas e odeias
Creio em ti
Porque tu choras e te alegras
Creio em ti
Porque tu vives em meus olhos
Creio em ti
Porque tu não és obra do acaso
Creio em ti
Porque tu sofres até sangrar
Creio em ti
Porque tu tens alma e espírito
Creio em ti
Porque tu duvidas de mim e de ti
Creio em ti
Porque somos a dúvida que crê.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Caminho de Gasconha

Hei de chegar a Gasconha,
Poisque estoy contente.

Preciso cantar pelo caminho,
Recitar versos aos caminhantes,
Ouvir os passos dos sem rumo
E sem rumo me fazer andante.

Quero mirar a bela Leonor
Na morada del emperador.
Per claro vou contente
Ver a mais hermosa regente.

Neste dia que nunca se acaba,
Sinto felicidade na aragem calma
Que sopra do amor que se sente
Até os lábios da bela fulgente.

Hei de chegar a Gasconha,
Por que hei de pensar diferente?

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Soneto da Estrela em rabisco

O céu noturno não é só geometria,
É brincadeira dos deuses meninos
Para distrair pequenos anjos,
Para ter nossos olhos no infinito.

Parado, a noite olho e medito
Sobre os significados das luzes
Que oscilam em ondas num mar
Escuro, de tudo ausente e vazio.

Vejo as constelações com formas
De gente, heróis, objetos e signos,
Garranchos em cadernos de infância.

Quem desenhou aquela estrelinha fraca,
Que anjo a rabiscou quase sem luz
E ma cedeu para guiar-me pelo abismo?

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Saudade em meio expediente

Há saudades e saudades.
A pior delas costuma
Fazer meio expediente
No turno da noite insone.

Vem do nada, tristonha
Porque já foi tudo e alegre.
Vem e pelo quarto fica,
Abre o guarda-roupa,
Revira gavetas.
Brinca com coisas mortas
Porque ela se faz viva.

Apanha depois um retrato,
Olha-nos, censura-nos,
Sem dizer palavra alguma.
Ao amanhecer ela se vai
No seu ir com volta marcada.

Embora metade, porém verdade,
Essa saudade vai e leva consigo
Grandes vazios, grandes sonhos
E pior, o beijo, o impossível beijo,
De quem queríamos ter beijado.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Lusos marujos

Soltem a corda da abita
Lancemos-nos ao mar
Lusos marujos
O oceano é feito de saudades
De água que não mata a sede
Aproveitemos o alívio do vento
Que sopra sobre nossas feridas
E nos leva para o desconhecido
Em que nosso último adeus habita.

Avessado

Dizem que vivo no avesso
É que o lado direito
Não me faz nada bem.

Acontece que avessado
É que se conhece
As coisas por dentro.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Amor abusado

Desejo um amor torrencial,
Desses que provocam enchentes
E nos afogam a cada meio segundo.

Um amor tirano, porém delicado.
Um amor que morre de ciúme
De outros amores imaginários.

Cansa-me o amor sem sal,
Que na realidade não é amor,
É algo quase que fraternal,
Uma amizade melhorada
E com permissões extras
De aproximação e afagos,
Com horários de entrada e saída
E muxoxos à preguiça no expediente.

O amor que desejo, o amor que quero,
Não pede permissão para existir,
Ele nasce e se instala no corpo inteiro,
Sem cerimônias, abusado mesmo.

Isso, quero um amor abusado,
Desses que nos fazem suicidas
Com imensa vontade de viver!

Os leitores dalma

Desconfiem de quem não gosta de poesia
E também de quem mal diz dos poetas.
Os narcisos só cultuam lisa superfície
Que reflete as imagens que a si desejam.

Os poetas são exímios leitores dalma
E por isso assustam aos que têm algo
Muito escuro nela, algo a se esconder.

Os poetas apavoram, e sobremodo,
Àqueles que não têm alma, os ocos,
Os vazios, os vãos, os fúteis, os superficiais,

Ou àqueles que suas almas hipotecaram
Sem as mínimas esperanças de resgatá-las
De quem as comprou para uso e descaso.

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Ilustração: "O beijo dos amantes" - René Magritte

Sinfonias matinais

Escuto a sinfonia da manhã
Estreitada pela minha janela.
Lá fora, um mundo de sons,
Cá dentro, o silêncio apenas.

Há um canário,
Há sabiás, cães...
Que vibram
Em natural escala.

Há ruídos de máquinas,
Há gritos de homens,
Que desafinam
O dia que acorda.

Assim se fazem essas manhãs,
Repetidas em si,
Com arranjos atonais,
Permeadas de acordes bárbaros,
Marcadas pela ausência de metro
E regidas pelo tédio dos séculos
A violar os silêncios.

Preciso tirar o homem
Da minha janela,
Suas máquinas e seus gritos,
Para afinar as minhas manhãs
Como uma sinfonia de Bach.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Inconstâncias

Qu'ria desenredar-me, e mais me enredo:
Tais os extremos em que triste vivo! (Camões).


Como domar as inconstâncias do espírito;
Suas inquietações com a vida aborrecida
A qual me obrigo e sem querer tal obrigação?

Caso nos céus se façam nuvens claras,
Meu querer é que se façam escuras,
Simplesmente porque gosto da chuva.

Caso tu me digas que me amarás sempre,
Duvidarei da eternidade de teu amor,
Porque tudo que me cerca me diz finito.

Somente os desprovidos de juízo
Podem alcançar a constância de espírito
E ruminar o tempo temperado pelo nada.

Nada há mais constante do que a loucura
Contida em não se contestar, em não se saber.
Somente os alienados têm o espírito em paz.