A IGNORÂNCIA A SERVIÇO DOS PILANTRAS
Um cascudo naqueles que dizem que a escola não deve ensinar o padrão culto da língua portuguesa, inclusive cascudos duplos em alguns gênios do MEC. Ora, as leis são escritas nesse padrão, os trabalhos científicos e também todo pensamento de alguma importância para a humanidade. Não ensinar o português corretamente dentro desse padrão, mesmo que dele não se faça uso em situações corriqueiras, é condenar uma grande massa à ignorância - analfabetos funcionais que estão no mundo, mas sem os mecanismos básicos para entenderem-se no mundo. Quem não conhece a própria língua torna-se massa de manobra dos governos e candidatos a ditadores, das elites que escravizam, dos pilantras letrados que legislam, nos roubam e por vezes nos matam. Não esqueçam que a decadência do Império Romano começou três séculos antes com a decadência da língua. Ao seu final, ninguém mais observava as leis porque não se conseguia decifrá-las. Sem língua, sem lei, sem Império, sem conhecimento e mil anos de ignorância e trevas.
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Um cascudo naqueles que dizem que a escola não deve ensinar o padrão culto da língua portuguesa, inclusive cascudos duplos em alguns gênios do MEC. Ora, as leis são escritas nesse padrão, os trabalhos científicos e também todo pensamento de alguma importância para a humanidade. Não ensinar o português corretamente dentro desse padrão, mesmo que dele não se faça uso em situações corriqueiras, é condenar uma grande massa à ignorância - analfabetos funcionais que estão no mundo, mas sem os mecanismos básicos para entenderem-se no mundo. Quem não conhece a própria língua torna-se massa de manobra dos governos e candidatos a ditadores, das elites que escravizam, dos pilantras letrados que legislam, nos roubam e por vezes nos matam. Não esqueçam que a decadência do Império Romano começou três séculos antes com a decadência da língua. Ao seu final, ninguém mais observava as leis porque não se conseguia decifrá-las. Sem língua, sem lei, sem Império, sem conhecimento e mil anos de ignorância e trevas.
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A ERUDIÇÃO DA MERDA
Digo e repito: o palavrão conservou a nossa língua. É lógico que essas palavras "sujas" sempre estiveram ocultas para não servirem de maus exemplos às crianças, mais faladas do que escritas. Mas a merda, por exemplo, é uma palavra erudita, veio lá do latim; 700 anos antes de Cristo já era gritada em qualquer topada inconveniente e sobreviveu em nosso idioma escrita como sempre foi: merda. Até Júlio César ao ser apunhalado no Senado deve ter excalmado: "Que merda Brutus, até tu?!!!". Por isso, diga merda à vontade, pois merda é a mais pura erudição e expressão de cultura. Nos bons dicionários de latim, merda, merdae, substantivo (nome) primeira declinação, feminina.
São terríveis certas palavras e expressões. Alma e espírito, por exemplo. Dizem muito, entretanto sem se explicarem. Por desgraça, estes espectros da realidade habitam outros mundos, etéreos por certo, dos quais só temos vagas e imprecisas notícias. Em literatura, essas duas palavras teimam em existir, mesmo que o autor nunca delas faça uso. Em Alexei Pechkov, nosso “amargo” Gorki (foto), encontramos vários espíritos que habitam sua obra. Na maior parte, espíritos de revolta contra a condição humana, porém de profundo respeito ao que nos faz humanos.
No Brasil, temos dois notáveis textos sobre este escritor russo, um de Carpeaux e outro de Cony, que buscam desvendar o espírito — ou espíritos — de Gorki que, aliás, ele mesmo esboçara em “As minhas universidades” por meio da fala da personagem Nicolau, um químico com ares de filósofo.
O espírito de Gorki fundamenta-se na liberdade: “Não esqueças o que já sentes dentro de ti: a liberdade de pensamento é a única, e bem preciosa, liberdade acessível ao homem. E só a possui aquele que, nada aceitando por dogma, explora tudo, aquele que compreendeu bem a continuidade da evolução, o seu movimento infatigável, a perpétua mutação dos fenômenos ”, ensinou-lhe Nicolau.
Otto Maria Carpeaux ocupou-se em situar Alexei Pechkov na linha do tempo. Para Carpeaux, ele simplesmente descobre um mundo novo na literatura russa. Gorki nascera pobre e ficara órfão aos nove anos. Em decorrência, foi aprendiz de sapateiro, pintor de ícones, faxineiro, cozinheiro de navio e padeiro, enquanto aprendia as letras por conta e tornava-se escritor. Tudo isso intercalado por andanças intermináveis pela Rússia czarista. Mas tendo uma vida assim, digamos, para lá de miserável e incerta, o que Gorki descobriu? Ele descobriu um povo não menos miserável do que ele e que poderia habitar como protagonista as páginas de seus livros. Ele descobriu a alma do povo que aparecera até então nas obras literárias como apêndice de dramas, geralmente pessoais, de uma nobreza moribunda e de uma burguesia emergente e entediada. Carpeaux observa que nos escritos de Gorki não há lugar para os aristocratas e latifundiários, muitas vezes com sentimentos de culpa, como em Tolstoi e nas peças de Tchekov. Não há espaço também para burocratas, tiranos e corruptos como em Gogol; ou ainda para os camponeses (“muchicks”) idealizados, quando não santificados, pelos escritores russos. A obra de Gorki trata fundamentalmente dos vagabundos e desempregados, desajustados que vagavam pelas cidades e estepes da Rússia. Mas o genial é que Gorki traz à luz não somente este “lumpemproletariat” que buscava na vagabundagem uma opção de vida, talvez a única naquela Rússia pré-industrial. Ele traz também um tipo diferente que não costumava freqüentar as salas de tipografia em que os livros eram compostos. A genialidade de Gorki está em mesclar os personagens do lumpemzinato aos desertores da vida — pelo menos da vida como pensamos que é, com regras, códigos, licenças para respirar e cuspir.
Em o “Vagabundo Original”, somos apresentados ao Dr. A. P. Ruminski, médico que morreu entre os mendigos. Um homem que, sem ficar demente, simplesmente resolveu viver os últimos anos de sua vida segundo sua própria filosofia. Ruminski agrada a Gorki porque, no fundo, ambos compartilham praticamente do mesmo pensamento. Para o médico, a felicidade está em o homem ter-se inventado bem a si mesmo e amar a sua invenção. “Amar-se a si próprio pode fazê-lo um porco, um cão, qualquer animal. Faz-se por instinto! O homem, contudo, apenas deve amar aquilo que ele mesmo criou para si.” E Gorki pergunta-lhe: “E o senhor o que ama?”.
“O meu amanhã (...) Tenho a ventura de não conhecer o que ele será”, respondeu-lhe o doutor, que se guiava por uma moral fatalista. “Eu sou um condenado à morte, tenho o direito de viver ao meu modo. Não preciso para nada das leis humanas, visto que igualmente para mim a lei natural da geral destruição é obrigatória.”
Por outro lado, a análise de Carlos Heitor Cony tenta captar o espírito político de Gorki, que viveu no período mais intenso das transformações sociais, culturais e econômicas da Rússia. Alexei Maximovitch Pechkov nasceu em 1862 em Nijini-Novgorod. Aos 36 anos ele aparece para a literatura em definitivo e ganha o coração do povo russo, em todas as classes sociais. Vivendo na época violenta e tirânica dos czares, atravessando alguns movimentos revolucionários fracassados, como o de 1905, ele abraçou o socialismo, sendo preso e condenado à morte. Foi salvo por um grande movimento internacional de intelectuais.
Taxado equivocadamente de “pai da literatura proletária”, Gorki é julgado pela Academia Comunista, organismo máximo do pensamento soviético, em 1927. A tola questão: ele era ou não um “escritor-proletário”? A Academia decidiu que não, mas por sorte, Stalin ignorou esta picuinha acadêmica, talvez simplesmente por gostar do que escrevia Gorki, ou por saber das antigas divergências entre o escritor e Lenin.
De acordo com Cony, Lênin e Gorki foram socialistas, à maneira deles. “Em Gorki, o socialismo não passa a sua fase primitiva: amor aos homens, confiança no homem — aquele cristianismo eslavo que talvez mereça o nome de russismo. Gorki não aceitava, sobretudo, o problema da consciência, tal como Lênin o expunha. Para Lênin, a consciência era um produto do ser social, ao passo que Gorki acreditava que o ser social era um produto da consciência. Lênin era um erudito, homem disciplinado intelectualmente, amante feroz da lógica e da razão. Gorki, o autodidata contraditório e sentimental.”
E é justamente neste ponto que encontramos o verdadeiro espírito gorkiano: humanista por excelência e, sobretudo, sentimental. Suas personagens, mesmo as comprometidas com as lutas sociais, como as encontradas na peça “Pequenos Burgueses”, aparecem duras num realismo sem precedentes, todavia com seus corações envoltos pela mais pura ternura.
Em “As minhas universidades”, que não vou classificar como biografia de Gorki, pois me parece que quase tudo que ele escreveu está nesta categoria, encontramos belas descrições feitas a partir de uma visão deliciosamente humana: “Os Evreinov, mãe e dois filhos, viviam de uma pensão miserável. Logo nos primeiros dias observei a tristeza trágica com que a pobre viúva, de estatura pequena e apagada, estendia sobre a mesa da cozinha as compras insignificantes que fizera no mercado, procurando solucionar este difícil problema: como tirar de tão insignificantes pedaços de carne de terceira, quantidade suficiente de boa alimentação para três rapazes saudáveis, sem já contar com ela mesma. Taciturna, os seus olhos cinzentos refletiam a teimosia doce e resignada do cavalo esgotado pelo trabalho excessivo: o pobre animal arrasta a carroça na ladeira; sabe que não chegará ao fim, mas continua”. Notem, que nesta descrição, dentre tantas outras presentes na obra de Gorki, não há nada de panfletário, de comunista, nem mesmo uma única linha na tentativa de explicar as causas da miséria dos Evreinov. Gorki apenas constata o sofrimento e usa para tal aquilo que o transformou num dos maiores escritores do século XX, o olhar do coração em conflito com a realidade.
O lado sentimental do autor de a “A Mãe” aparece mais nitidamente associado às mulheres. Bachkine, outro personagem de “As minhas universidades”, ladrão profissional, ex-aluno da escola normal, tuberculoso, “mais de uma vez impiedosamente espancado”, aconselhava Gorki: “Pela mulher, faria fosse o que fosse. Para ela, como para o demônio, o pecado não existe. Viver a amar, ainda nada se inventou de melhor.”
De certa maneira, o conselho do ladrão profissional calou fundo na alma do escritor. Quase no final de suas memórias, ele dedica um capítulo especial para o seu “Primeiro Amor” e num momento de reflexão emenda: “Quando não se sabe, inventa-se, e o que o homem inventou de mais sensato, foi amar a mulher e adorar a sua beleza; é deste amor que nasce tudo quanto é mais belo no mundo”.
Certamente celibatário, ao 23 anos Gorki conta ter conhecido Olga, dez anos mais velha, casada e que tinha uma filha, fruto de outro relacionamento. No início, ele alimenta-se de um amor platônico. Depois, patético, como todo amante deve ser, se declara em poemas e bucólicos passeios pelo lago. Neste episódio, Gorki não fica devendo nada aos escritores românticos: crises existenciais, medo da rejeição, o conflito moral de sabê-la casada etc. Porém, mesmo neste aparente e necessário pieguismo literário, o escritor não deixa seu velho estilo realista. É como se seu coração fosse ritmado por um batuque de alegria e esperança e a vida por ruídos de espanto e horror.
Olga é instruída, bonita e inteligente, um verdadeiro imã para que hoje chamamos cantadas, entretanto pobre. Vive como a maioria do povo russo, em dificuldades. O marido é preguiçoso e indolente. Sujeito que não se envergonha de ver a mulher se matar de trabalhar, às vezes como criada e cozinheira, às vezes como desenhista de retratos.
Gorki não pestanejou em convidá-la para viverem juntos. Ela faz suspense, não diz sim, nem não. Ele parte para outra cidade e ela fica. Depois de três anos há o reencontro. Desta vez Olga se decide e vai viver com o jovem escritor.
Os três, pois a filha de Olga também os acompanha, passam a morar numa casa úmida, fria e ruim. Pelo que parece, pois não temos a medida do tempo neste capítulo de Gorki, por um longo período eles fazem as refeições na casa do diabo, com o pão amassado pelo próprio, é claro. E o que enternece o escritor é que neste tempo todo, Olga não reclamou uma única vez da triste situação.
Não brigavam, mas discordavam no modo de encarar a vida. “Filosofas demais”, dizia a mulher ao novo marido. “A vida, no fundo, é simples e brutal; não devemos complicá-la, procurando nela um sentido extraordinário; o que devemos é aprender a suavizar-lhe a brutalidade. Mais do que isso, não conseguirás nunca. (...) O amor e a fome governam o mundo, e a filosofia faz sua desgraça. Vive-se para o amor, é o que há de mais importante na vida”, dizia Olga.
Num dia qualquer, o escritor descobriu o que quase todos descobrem e que só ousamos contar com todas as letras no século XX: o amor é chama. Somente o compartilhar diário do travesseiro para se conhecer a natureza dos elementos que extinguem este fogo.
Felizmente ou não, a sociedade industrial desobrigou os homens e as mulheres dos compromissos eternos. Atores coadjuvantes desse tempo bárbaro — movido pela máquina e pelo pragmatismo até mesmo no amor —, dois fatos foram suficientes para que eles se separassem. O primeiro, o mais terrível: Olga dormira enquanto Gorki lia um de seus manuscritos ao pé do seu ouvido. O segundo, e a gota d’água: foi quando o escritor chegou em casa transtornado depois de ter presenciado um policial espancar covardemente um judeu no mercado. “Quando lhe falei no judeu espancado, mostrou-se muito surpreendida: — E é isso que te deixa maluco? Que nervos tão frágeis os teus!”.
Gorki teve outras mulheres e parece ter amado de verdade somente a primeira. Ele morreu em 1936, suspeita-se que vitima de envenenamento. Talvez ele tenha morrido mesmo do mais sutil dos envenenamentos, aquele provocado pela absorção lenta da realidade e deste supremo escândalo que é viver sem se saber explicar. Mas aí já entramos em Camus, e isto é um outro papo!
O PAÍS DOS DEGREDADOS
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GORKI E SEUS ADORÁVEIS VAGABUNDOS
São terríveis certas palavras e expressões. Alma e espírito, por exemplo. Dizem muito, entretanto sem se explicarem. Por desgraça, estes espectros da realidade habitam outros mundos, etéreos por certo, dos quais só temos vagas e imprecisas notícias. Em literatura, essas duas palavras teimam em existir, mesmo que o autor nunca delas faça uso. Em Alexei Pechkov, nosso “amargo” Gorki (foto), encontramos vários espíritos que habitam sua obra. Na maior parte, espíritos de revolta contra a condição humana, porém de profundo respeito ao que nos faz humanos.
No Brasil, temos dois notáveis textos sobre este escritor russo, um de Carpeaux e outro de Cony, que buscam desvendar o espírito — ou espíritos — de Gorki que, aliás, ele mesmo esboçara em “As minhas universidades” por meio da fala da personagem Nicolau, um químico com ares de filósofo.
O espírito de Gorki fundamenta-se na liberdade: “Não esqueças o que já sentes dentro de ti: a liberdade de pensamento é a única, e bem preciosa, liberdade acessível ao homem. E só a possui aquele que, nada aceitando por dogma, explora tudo, aquele que compreendeu bem a continuidade da evolução, o seu movimento infatigável, a perpétua mutação dos fenômenos ”, ensinou-lhe Nicolau.
Leon Tolstoy e Gorki |
Em o “Vagabundo Original”, somos apresentados ao Dr. A. P. Ruminski, médico que morreu entre os mendigos. Um homem que, sem ficar demente, simplesmente resolveu viver os últimos anos de sua vida segundo sua própria filosofia. Ruminski agrada a Gorki porque, no fundo, ambos compartilham praticamente do mesmo pensamento. Para o médico, a felicidade está em o homem ter-se inventado bem a si mesmo e amar a sua invenção. “Amar-se a si próprio pode fazê-lo um porco, um cão, qualquer animal. Faz-se por instinto! O homem, contudo, apenas deve amar aquilo que ele mesmo criou para si.” E Gorki pergunta-lhe: “E o senhor o que ama?”.
“O meu amanhã (...) Tenho a ventura de não conhecer o que ele será”, respondeu-lhe o doutor, que se guiava por uma moral fatalista. “Eu sou um condenado à morte, tenho o direito de viver ao meu modo. Não preciso para nada das leis humanas, visto que igualmente para mim a lei natural da geral destruição é obrigatória.”
Gorki e Stalin |
Taxado equivocadamente de “pai da literatura proletária”, Gorki é julgado pela Academia Comunista, organismo máximo do pensamento soviético, em 1927. A tola questão: ele era ou não um “escritor-proletário”? A Academia decidiu que não, mas por sorte, Stalin ignorou esta picuinha acadêmica, talvez simplesmente por gostar do que escrevia Gorki, ou por saber das antigas divergências entre o escritor e Lenin.
De acordo com Cony, Lênin e Gorki foram socialistas, à maneira deles. “Em Gorki, o socialismo não passa a sua fase primitiva: amor aos homens, confiança no homem — aquele cristianismo eslavo que talvez mereça o nome de russismo. Gorki não aceitava, sobretudo, o problema da consciência, tal como Lênin o expunha. Para Lênin, a consciência era um produto do ser social, ao passo que Gorki acreditava que o ser social era um produto da consciência. Lênin era um erudito, homem disciplinado intelectualmente, amante feroz da lógica e da razão. Gorki, o autodidata contraditório e sentimental.”
E é justamente neste ponto que encontramos o verdadeiro espírito gorkiano: humanista por excelência e, sobretudo, sentimental. Suas personagens, mesmo as comprometidas com as lutas sociais, como as encontradas na peça “Pequenos Burgueses”, aparecem duras num realismo sem precedentes, todavia com seus corações envoltos pela mais pura ternura.
Em “As minhas universidades”, que não vou classificar como biografia de Gorki, pois me parece que quase tudo que ele escreveu está nesta categoria, encontramos belas descrições feitas a partir de uma visão deliciosamente humana: “Os Evreinov, mãe e dois filhos, viviam de uma pensão miserável. Logo nos primeiros dias observei a tristeza trágica com que a pobre viúva, de estatura pequena e apagada, estendia sobre a mesa da cozinha as compras insignificantes que fizera no mercado, procurando solucionar este difícil problema: como tirar de tão insignificantes pedaços de carne de terceira, quantidade suficiente de boa alimentação para três rapazes saudáveis, sem já contar com ela mesma. Taciturna, os seus olhos cinzentos refletiam a teimosia doce e resignada do cavalo esgotado pelo trabalho excessivo: o pobre animal arrasta a carroça na ladeira; sabe que não chegará ao fim, mas continua”. Notem, que nesta descrição, dentre tantas outras presentes na obra de Gorki, não há nada de panfletário, de comunista, nem mesmo uma única linha na tentativa de explicar as causas da miséria dos Evreinov. Gorki apenas constata o sofrimento e usa para tal aquilo que o transformou num dos maiores escritores do século XX, o olhar do coração em conflito com a realidade.
O lado sentimental do autor de a “A Mãe” aparece mais nitidamente associado às mulheres. Bachkine, outro personagem de “As minhas universidades”, ladrão profissional, ex-aluno da escola normal, tuberculoso, “mais de uma vez impiedosamente espancado”, aconselhava Gorki: “Pela mulher, faria fosse o que fosse. Para ela, como para o demônio, o pecado não existe. Viver a amar, ainda nada se inventou de melhor.”
De certa maneira, o conselho do ladrão profissional calou fundo na alma do escritor. Quase no final de suas memórias, ele dedica um capítulo especial para o seu “Primeiro Amor” e num momento de reflexão emenda: “Quando não se sabe, inventa-se, e o que o homem inventou de mais sensato, foi amar a mulher e adorar a sua beleza; é deste amor que nasce tudo quanto é mais belo no mundo”.
Certamente celibatário, ao 23 anos Gorki conta ter conhecido Olga, dez anos mais velha, casada e que tinha uma filha, fruto de outro relacionamento. No início, ele alimenta-se de um amor platônico. Depois, patético, como todo amante deve ser, se declara em poemas e bucólicos passeios pelo lago. Neste episódio, Gorki não fica devendo nada aos escritores românticos: crises existenciais, medo da rejeição, o conflito moral de sabê-la casada etc. Porém, mesmo neste aparente e necessário pieguismo literário, o escritor não deixa seu velho estilo realista. É como se seu coração fosse ritmado por um batuque de alegria e esperança e a vida por ruídos de espanto e horror.
Olga é instruída, bonita e inteligente, um verdadeiro imã para que hoje chamamos cantadas, entretanto pobre. Vive como a maioria do povo russo, em dificuldades. O marido é preguiçoso e indolente. Sujeito que não se envergonha de ver a mulher se matar de trabalhar, às vezes como criada e cozinheira, às vezes como desenhista de retratos.
Gorki não pestanejou em convidá-la para viverem juntos. Ela faz suspense, não diz sim, nem não. Ele parte para outra cidade e ela fica. Depois de três anos há o reencontro. Desta vez Olga se decide e vai viver com o jovem escritor.
Os três, pois a filha de Olga também os acompanha, passam a morar numa casa úmida, fria e ruim. Pelo que parece, pois não temos a medida do tempo neste capítulo de Gorki, por um longo período eles fazem as refeições na casa do diabo, com o pão amassado pelo próprio, é claro. E o que enternece o escritor é que neste tempo todo, Olga não reclamou uma única vez da triste situação.
Não brigavam, mas discordavam no modo de encarar a vida. “Filosofas demais”, dizia a mulher ao novo marido. “A vida, no fundo, é simples e brutal; não devemos complicá-la, procurando nela um sentido extraordinário; o que devemos é aprender a suavizar-lhe a brutalidade. Mais do que isso, não conseguirás nunca. (...) O amor e a fome governam o mundo, e a filosofia faz sua desgraça. Vive-se para o amor, é o que há de mais importante na vida”, dizia Olga.
Num dia qualquer, o escritor descobriu o que quase todos descobrem e que só ousamos contar com todas as letras no século XX: o amor é chama. Somente o compartilhar diário do travesseiro para se conhecer a natureza dos elementos que extinguem este fogo.
Felizmente ou não, a sociedade industrial desobrigou os homens e as mulheres dos compromissos eternos. Atores coadjuvantes desse tempo bárbaro — movido pela máquina e pelo pragmatismo até mesmo no amor —, dois fatos foram suficientes para que eles se separassem. O primeiro, o mais terrível: Olga dormira enquanto Gorki lia um de seus manuscritos ao pé do seu ouvido. O segundo, e a gota d’água: foi quando o escritor chegou em casa transtornado depois de ter presenciado um policial espancar covardemente um judeu no mercado. “Quando lhe falei no judeu espancado, mostrou-se muito surpreendida: — E é isso que te deixa maluco? Que nervos tão frágeis os teus!”.
Gorki teve outras mulheres e parece ter amado de verdade somente a primeira. Ele morreu em 1936, suspeita-se que vitima de envenenamento. Talvez ele tenha morrido mesmo do mais sutil dos envenenamentos, aquele provocado pela absorção lenta da realidade e deste supremo escândalo que é viver sem se saber explicar. Mas aí já entramos em Camus, e isto é um outro papo!
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Num país formado a partir de degredados não se poderia esperar Justiça. Boa parte dos portugueses que aqui aportaram já vinha com a orelha cortada pela corte e se transformava em autoridade. Portugal ficou com o melhor e nos deu o pior. Essa é nossa história, realidade e vergonha, que não ousamos tocar.
Encontrado na Suécia e agora em França, um peixe, possivelmente uma espécie de baiacu, que recebeu o nome de morde-testículos! -- Como todo nome guarda em si verdades, alguém hoje anda desprovido das provas de sua masculinidade.
Estava bom demais, o Senado quer manter voto secreto para vetos presidenciais, ou seja, a política do toma-lá-dá-cá continua como sempre foi, uma vergonha. Eleitor, como sempre, não vai ficar sabendo quem está no bolso do governo e quem faz as falcatruas em troca de voto.
Outra do Senado -- na mini-reforma política -- ou reforma engana-trouxas -- os senadores nem levantaram a hipótese de acabar com o financiamento privado das candidaturas, discutem apenas se o nome do doador deve ser informado no começo ou no fim das campanhas eleitorais. Muita cara-de-pau dos nossos ilustres senadores, porque no financiamento eleitoral é que está o germe de todas as maracutaias.
Hoje conheci Maria Rita. Gente miúda, 7 anos apenas e um olhar de três anos e meio do mais puro sofrimento, vinha de uma quimioterapia. Brincava com brinquedinhos de louça. Sonolenta e triste, parecia ter uma alma também de louça, daquelas antigas, trincadas de tanto uso, mas milagrosamente inquebrável. Sorriu-me com um riso triste que perguntava por quê?... Por que, dentre tantas crianças com a alma de louça, fora a escolhida para a dor. Justamente ela, que estava ali com o peito deformado por um coração enorme que suportava até mesmo um jornalista que vê nos seres humanos apenas elementos para sua curiosidade.
Espião brasileiro é tão puro que não espiona, é espionado -- dedução a partir da massa de besteiras jogadas ao mundo pelo nosso pudico governo petista, honesto de dar dó. Serviço secreto só serve para isso mesmo, espionar. O problema é que o serviço norte-americano funciona.
A notícia seria notícia se fosse o Brasil espionando os EUA. Agora, os EUA espionando o Brasil não é notícia, é fato antigo.
Tenho medo desse povo que gosta de dar nomes diferentes para os filhos, principalmente os que acompanham o julgamento do escândalo do Mensalão; logo vamos ter por aí cidadãos com nomes: Dosemetria da Pena e Silva; Embargos Infringentes dos Santos; Revisor Ministro de Almeida...
Aquele velho "revolucionário" no seu gabinete com ar condicionado, com um gordo cargo de comissão, olha pela janela, vê o povo brasileiro se manifestando contra o roubo e corrupção, imediatamente corre para as redes sociais da internet e vomita: "Esse povinho é reacionário, quer acabar com a minha boquinha, essa moleza que é ser pago para puxar o saco do governo e dos mensaleiros!"
Greve geral de 1989, o pau quebrando, a polícia batendo no proletariado; chega a repórter, dessas fresquinhas, e pergunta o nome do líder dos grevistas e o povo reponde que era um estivador grandão, tipo 4x4, que estava lá na frente das manifestações e que se chamava Mandioca. Daí a repórter pergunta a razão daquele apelido de Mandioca e os operários rolam no chão de tanto rir... E mandam a bobinha dar uma conferida de perto nas partes baixas do sujeito.
Havia aquela repórter que confessou na redação do jornal -- "Quando estou em depressão, coloco uma sainha e passo na frente de uma obra cheia de pedreiros: é o milagre do assobio, fico ótima na hora !!!"
A polícia apreendeu dois mil quilos de maconha misturada com uma carga de cebola. Ora, temos aí MAIS um caso de cebola temperada pela vovó que se confundiu, pensando que a maldita era orégano!
Na Floresta encantada, a Branca de Neve estava fugindo dos sete anões quando encontra o Pequeno Príncipe, que parecia querer falar alguma coisa. Ela nem deixou o paspalho abrir a boca -- " Vem não, seu fresco! Não vem com essa historinha que sou responsável pelo que cativo, pode enfiar esses anões na..." -- Bocuda essa Branca de Neve!
Não sei quem escreveu, mas belo é editorial da Gazeta do Povo desta sexta-feira (6/7/13). Corajoso no aspecto de defesa da liberdade de imprensa e mais corajoso ainda em se expressar no bom português, artigo muito em falta em nossos jornais. Outro aspecto foi a coragem de se usar uma citação clássica latina para demonstrar a verdade, pois no latim está guardada a precisão das ideias. Verdadeiro desafio aos minimalistas linguísticos que, por não dominarem nosso idioma, classificam de "erudição desnecessária" tais citações. Sujeitos que, pregando asneiras desse quilate, prestam desserviço à educação de nosso povo, pois têm como único paradigma de educação a própria ignorância, nada mais. Quanto a citação: Diligite Justitiam Vos Qui Iudicatis Terram (Amai a justiça vós que julgais a Terra), encontrada em Dante Alighieri, é o verdadeiro fundamento de vida para aqueles que desejam realmente um mundo justo, sem censuras, sem escaramuças jurídicas para se preservar a injustiça. Infelizmente, o latim foi retirado das grades e currículos das escolas brasileiras, justamente porque é uma língua que nos obriga a pensar. E pensar neste país está proibido por decreto governamental e portarias do Ministério da Educação e faz tempo.
POESIA ERÓTICA
Ao observar as recentes atrocidades na Síria concluo que os últimos três mil anos de civilização da humanidade não passaram de um grande engodo. Não somos civilizados, somos apenas dentre os seres vivos a coisa mais vil que se desenvolveu sobre a Terra. Animais que aprenderam a falar apenas para mentir e que desenvolveram as garras com o polegar opositor apenas para matar e fazer sofrer seus semelhantes, além de contar dinheiro, é claro.
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MORRER SÓ
"Meu grito de frio guerreiros ouvi
Sou bravo, sou forte, da tribo Tingüi
Mas não sou besta, vamos embora daqui!!!" -- Cacique Tindiquera ao entregar na sacanagem as terras aos portugueses para a fundação de Curitiba, um pouco antes do Inverno de 1693.
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FUMO NA BORCETA - Certas palavras em português nascem nome da coisa porquanto deveriam ser geradas como qualidade da coisa. "Paralelepípedo" por exemplo, com sete sílabas já diz que a coisa é feia e pesada. Agora, a palavra "peteca" vem cheia de fofura e maciez, feita de leves plumas e esvoaçantes penas; palavra de alcova, para ser dita entre amantes e, portanto, não é à toa que é sinônimo informal da cuja - feminina e bela. Outras há que já nascem condenadas pelos hipócritas iletrados por se assemelharem a nomes feios. A palavra "borceta" é uma delas, talvez uma das mais injustiçadas de nossa língua, que nada mais é do que uma pequena bolsa feita para guardar fumo e que os falsos pudicos a evitam e se afrescalham ao designá-la apenas como "bolsinha de tabaco". Isso dito, não tropece em paralelepípedos linguísticos, pois peteca é uma coisa fofa e comestível dependendo do rijo fumo que você guarda na borceta. (06/08/13)
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VÍTIMA PROVIDENCIAL
Nada como uma vítima imolada em sacrifício para se ter um mártir para uma causa, mesmo que espúria.
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GUERRAS NÃO SÃO POR AMOR
Com o perdão de Helena, mas guerra alguma teve como motivo sentimentos nobres da humanidade, como o amor, ou compaixão. São os poetas que conseguem ver essas coisas embutidas na barbárie, porque na guerra está o coração do homem repleto de paixões em ato extremo. Toda guerra é apenas cobiça, roubo e matança em nome de ideais tão estúpidos quanto os que se matam e se glorificam por causa dessas torpezas.
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O MORDE-TESTÍCULOS
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GUERRAS NÃO SÃO POR AMOR
Com o perdão de Helena, mas guerra alguma teve como motivo sentimentos nobres da humanidade, como o amor, ou compaixão. São os poetas que conseguem ver essas coisas embutidas na barbárie, porque na guerra está o coração do homem repleto de paixões em ato extremo. Toda guerra é apenas cobiça, roubo e matança em nome de ideais tão estúpidos quanto os que se matam e se glorificam por causa dessas torpezas.
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O MORDE-TESTÍCULOS
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FALCATRUA SECRETA
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SENADO CARA-DE-PAU
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ALMA DE LOUÇA
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ESPIONAGEM TUPI
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O QUE É NOTÍCIA?
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A EVOLUÇÃO DA LÍNGUA
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O "REVOLUCIONÁRIO"
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A BOBINHA
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A DEPRESSIVA
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O TEMPERO DA VOVÓ
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O PRÍNCIPE FRESCO
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LIDERANÇAS FAJUTAS
Nas manifestações populares que explodiram no Brasil neste ano da graça de 2013, a maior "dor" para essas roliças lideranças de "esquerda" é descobrir que não são lideranças de porcaria alguma; viveram até hoje da enganação, das tetas sindicais e públicas, mais nada!
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BRASIL, PROIBIDO PENSAR
Nas manifestações populares que explodiram no Brasil neste ano da graça de 2013, a maior "dor" para essas roliças lideranças de "esquerda" é descobrir que não são lideranças de porcaria alguma; viveram até hoje da enganação, das tetas sindicais e públicas, mais nada!
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BRASIL, PROIBIDO PENSAR
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ROMA E BRASÍLIA
Lendo Suetônio. Roma era uma zona, os governantes loucos, ladrões e corruptos. Mas em escala, a Roma antiga é jardim de infância perto de Brasília.
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ARTES E VANGUARDA
São as artes que sempre assumem a vanguarda do pensamento. Somente os reacionários não compreendem que são os artistas que conseguem ler o tempo em que vivemos com exatidão. A arte sempre está adiante dos conceitos e, principalmente, dos preconceitos firmados em séculos passados.
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ARTES E VANGUARDA
São as artes que sempre assumem a vanguarda do pensamento. Somente os reacionários não compreendem que são os artistas que conseguem ler o tempo em que vivemos com exatidão. A arte sempre está adiante dos conceitos e, principalmente, dos preconceitos firmados em séculos passados.
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POESIA ERÓTICA
De todos os temas da poesia, o mais difícil é o erotismo, porque há uma linha muita tênue separando o belo do chulo, o sublime do vulgar. E depois, ao se ler Ovídio, é de se pensar que o tema está quase que esgotado na originalidade e elegância que ele próprio exige dos poetas.
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DAS CARTILHAS
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DAS CARTILHAS
Mesmo instruído nas letras, se o sujeito nega-se a pensar por si e segue cartilhas do pensamento alheio, esse sujeito será sempre um escravo da ignorância, nunca um homem verdadeiramente livre.
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DO UFANISMO
O Brasil é o único país do mundo que tem uma "esquerda" que se ufana de ter feito uma revolução capitalista.
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DAS GUERRAS
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DO UFANISMO
O Brasil é o único país do mundo que tem uma "esquerda" que se ufana de ter feito uma revolução capitalista.
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DAS GUERRAS
Nas guerras atuais, ou em qualquer guerra, são tantas as atrocidades cometidas pelos beligerantes que tomar um posicionamento por esse ou aquele lado nos tornam tão ruins quanto os que matam seus semelhantes. Assim, a única posição possível para quem ainda tem um restinho de humanidade no coração é a defesa intransigente da paz. Em guerra ninguém tem razão, porque matar já é um ato irracional, o mais absurdo que pode ser praticado.
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O MAIS VIL DOS SERES
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O MAIS VIL DOS SERES
Ao observar as recentes atrocidades na Síria concluo que os últimos três mil anos de civilização da humanidade não passaram de um grande engodo. Não somos civilizados, somos apenas dentre os seres vivos a coisa mais vil que se desenvolveu sobre a Terra. Animais que aprenderam a falar apenas para mentir e que desenvolveram as garras com o polegar opositor apenas para matar e fazer sofrer seus semelhantes, além de contar dinheiro, é claro.
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O DANTAS
O DANTAS
Pergunto para meus filhos de quem é o livro que estão lendo e me respondem que é do "Dantas". Procuro na memória que escritor seria esse tal de "Dantas" e nada acho. Intrigado, pergunto a eles quem é esse descomungado do "Dantas" e me respondem: "É o nosso amigo que emprestou o livro!".
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FORMIGAS NO FIOFÓ
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FORMIGAS NO FIOFÓ
Algumas expressões de nossa língua são de causar espanto em qualquer cristão. Essa escutei há pouco na rua, quando passava por uma revenda de carros; não vi quem, mas suponho que era um casal discutindo ocultos pela luz da vitrine. O sujeito havia dito alguma coisa e a mulher lhe respondeu em meio a gargalhadas: "Este carro está te dando formiga no c*, é um tesão". Pobres formigas, amanhã caminharei por outras bandas e espero encontrar gente normal no meu caminho, gente que sinta tesão por coisas mais naturais e não tenha formigas no fiofó.
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MORRER SÓ
Quando criança observava atentamente os que chegavam na Santa Casa de Maringá, morava perto. Os casais de velhinhos passavam por mim e algum tempo depois, um deles retornava sozinho, a exibir uma fita preta costurada à mão no paletó ou vestido. Agora, em frente ao Hospital das Clínicas, vejo que quase todo mundo chega só, entra e desaparece. Em nosso tempo, a morte dispensa companhia.
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ABUNDÂNCIAS REVELADAS
ABUNDÂNCIAS REVELADAS
Sou das antigas e ainda frequento barbearia. Mas acho que vou procurar outro barbeiro. O cara ampliou o salão, colocou lá mais gente para trabalhar e uma placa na porta dizendo ser ali um ambiente "unissex". Nada contra, pois não enxergo porra nenhuma mesmo sem os óculos. Mas o sossego acabou. Antes tínhamos somente o plec plec das tesouras, o zumbido surdo e monótono das maquininhas de cortar cabelos e de uma hora para outra aquela tagarelice toda misturada com o infernal barulho dos secadores. A mulherada fala da vida, em detalhes cabeludos, como se ninguém estivesse presente. Feita a minha barba, antes de pagar, ouço a frase da mocinha do caixa para a madame: "ficou ótima essa blusa para você - é a cintura que delineia a bunda!". Putz, pensei, a mulher estava ali para arrumar o cabelo ou a bunda? Dei uma conferida respeitosa de canto do olho e... E não era que a mocinha estava com a razão, quanto mais marcada a cintura, maior é abundância revelada.
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A ESCOLA E O GADO
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A ESCOLA E O GADO
Salvo engano, ou obra genial ainda escondida dos mortais, a lógica nos manda pensar na causa que determina o efeito, em cadeias contínuas e interativas. Mas de ordinário, e aí falha nossa escola, ensinamos às novas gerações somente a análise do efeito; mostramos o cume da montanha sem, no entanto, fazer pensar no todo que é a montanha. Portanto, se hoje temos uma escola ineficiente no ensinar, com disciplinas ocupadas somente com o efeito, que não consideram uma longa construção histórica do conhecimento, continuaremos a formar gerações e gerações que supostamente sabem pensar sem, no entanto, entender a natureza das coisas. E isso é um crime que nos custará adiante muito caro, porque essas gerações estarão condenadas a viver como gado - como já vivemos - amando o pasto, porém sem questionar a cerca que as guardam para o abatedouro.
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REPORTAGENS EM LIVRO
REPORTAGENS EM LIVRO
Folheio o livro de um jornalista de ofício: texto correto segundo os manuais de redação, mas sem o brilho da arte: uma narrativa apenas. Boa parte de nós, escreventes profissionais, ainda não aprendeu que literatura abomina receituários, desdenha das personagens retilíneas e raramente tem como pano de fundo a falsa verdade da realidade. Literatura é ficção com personagens compostos aos pedaços, com bilhetes em branco para seguirem viagem sem destino na trama. O que sobra não é literatura, são grandes reportagens publicadas em livro com algum interesse histórico.
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A FERRADURA E A REDAÇÃO
Na faculdade de jornalismo somos iniciados no "grande mistério de se escrever bem" ou enganar o leitor: usar frases curtas e seguir religiosamente manuais de redação é o receituário. Lá pelas tantas, o vivente descobre que o Português não é uma língua sintética e exige grandes períodos para a perfeita expressão das ideias e que os manuais de redação não passam de receitas de editores preguiçosos, quando não obtusos e parvos, que têm medo de enfrentar a gramática e dicionários, ou o que pior, a própria ignorância que cavalga com pesadas ferraduras no picadeiro das redações.
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TINDIQUERA - O CACIQUE ESPERTO
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A FERRADURA E A REDAÇÃO
Na faculdade de jornalismo somos iniciados no "grande mistério de se escrever bem" ou enganar o leitor: usar frases curtas e seguir religiosamente manuais de redação é o receituário. Lá pelas tantas, o vivente descobre que o Português não é uma língua sintética e exige grandes períodos para a perfeita expressão das ideias e que os manuais de redação não passam de receitas de editores preguiçosos, quando não obtusos e parvos, que têm medo de enfrentar a gramática e dicionários, ou o que pior, a própria ignorância que cavalga com pesadas ferraduras no picadeiro das redações.
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TINDIQUERA - O CACIQUE ESPERTO
Sou bravo, sou forte, da tribo Tingüi
Mas não sou besta, vamos embora daqui!!!" -- Cacique Tindiquera ao entregar na sacanagem as terras aos portugueses para a fundação de Curitiba, um pouco antes do Inverno de 1693.
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FUMO NA BORCETA - Certas palavras em português nascem nome da coisa porquanto deveriam ser geradas como qualidade da coisa. "Paralelepípedo" por exemplo, com sete sílabas já diz que a coisa é feia e pesada. Agora, a palavra "peteca" vem cheia de fofura e maciez, feita de leves plumas e esvoaçantes penas; palavra de alcova, para ser dita entre amantes e, portanto, não é à toa que é sinônimo informal da cuja - feminina e bela. Outras há que já nascem condenadas pelos hipócritas iletrados por se assemelharem a nomes feios. A palavra "borceta" é uma delas, talvez uma das mais injustiçadas de nossa língua, que nada mais é do que uma pequena bolsa feita para guardar fumo e que os falsos pudicos a evitam e se afrescalham ao designá-la apenas como "bolsinha de tabaco". Isso dito, não tropece em paralelepípedos linguísticos, pois peteca é uma coisa fofa e comestível dependendo do rijo fumo que você guarda na borceta. (06/08/13)
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