segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Chora, Novembro

Vai, Novembro Na minha cidade, te despedes molhado Molha-me, Novembro Nas lágrimas incontidas de teus medonhos dias Na lama que desceu o morro e ganhou mares e rios Na morte que chegou aos ermos, Aos pacatos, aos inocentes Na chuva longínqua de chumbo do terror dos fanáticos Arfa, Novembro, em tuas derradeiras horas Chove, Novembro, com tua tristeza que nos envolve Chora, por toda violência que deram-te Por todo mal que fizeram-te Chora, Novembro, chove.

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Meu ranchinho está vazio (Chora viola)

Meu ranchinho está vazio
Chora viola
Meu coração apertado
Chora viola
A tristeza me venceu
Chora viola
O mundo entristeceu
Chora viola
Quando você me largou
Chora viola
E levou tudo que é seu
Chora viola
E me deixou a saudade
Chora viola
As lágrimas na minha boca
Chora viola
No último beijo seu
Chora viola
É o amargor que levo agora
Chora viola...
A amargura desse adeus
Chora viola...


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Das intenções do amor

Em nossos corações O amor nos surge em intensidades E intenções Tem o amor-carinho Fraquinho Mas que pode crescer Tem o amor-gratuito Grátis mesmo Que damos sem pensar no porquê Tem o amor-paixão Que surge violento, arrasador E vai embora como chegou Tem o amor-danado Aquele que damos Sem o outro merecer Tem o amor-bandido Que é dado e recebido Mas que nos cobra sofrimento Tem o amor-eterno Que gruda em nossas vidas Já pensando na outra vida E tem o amor-amor Aquele que, sem pedir licença Vem e fica e nos faz viver. Em todo caso, amai Viver sem isso, sem amor É fazer da vida desperdício.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

A grandeza do homem

A grandeza do homem
Não está apenas em perdoar o imperdoável
A grandeza do homem está em compreender
Que todo mundo erra, inclusive ele.

Explicações

Não preocupo-me mais em explicar o Universo e suas leis
Tão pequeno sou para isso
Quero apenas explicar-me o rubro de teu rosto quando te vejo
Tão contente sou com isso!

O caçador de preá

Quando vim pra Curitiba
Passei frio, passei fome,
Me cobria com um trapo,
Que todo orgulho consome.

Sonhava - Rato ou calango? -
Às vezes, queria magro preá,
Para o bucho sossegá,
Roncando, cheio de ar.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Mula brava

Monto esta mula brava,
Sina a me escoicear,
E meu medo é cair
Sem nem experimentar
Essa tal felicidade
De que tanto ouvi falar.

Se a amei?

Se, por longos anos, a amei?
Se, por muitos anos, continuarei?
Ah! Meu Senhor, 
Se feliz sou? Ah! Serei!?
Ah! Não sei... Ah! Não sei!

sábado, 7 de novembro de 2015

Finados

Dia de puxar assunto
Na reza para os defuntos
Amados finados, amados.

Dissimulada

Era tamanho o oceano de mentiras
Encrespado pelo vento da dissimulação
Que ela nunca alcançou, ou alcançaria
O amor ancorado no meu coração.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Borboleta em verso

Um verso que lembra a Primavera
Se finge de colorida borboleta
E arrodeia-te pedindo teu aroma de flor.

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Prova de vida

Andava roto e morto, sem graça
sem contentamentos
Sem amores, sem sonhos
Para o hoje e para o depois

As lembranças
A saudade do pouco doce havido
Do amargo sofrido
O procuravam em raros momentos

Morrera na pior morte possível
Na morte em que tudo ao redor se faz vivo
Precisava para si, urgente
Produzir uma prova de vida.

terça-feira, 20 de outubro de 2015

O mausoléu

Passaste a vida
Recolhendo para ti
Os tesouros do mundo
E agora que a vida passou
E dela te ausentaste
De que valeu?

Se os teus já dividem
A tua fortuna
Sobre a tua lápide
Em belo mausoléu
Que mandaste erguer
Para descanso de teus ossos

Ao longe chegam, vês?
Os últimos abutres
Que mastigarão tua carne
Em longa noite
Que tu terás
Apartado das lembranças
Daqueles amores gratuitos
Das flores agrestes
Da beleza do simples
Que nunca quiseste.
Negaste. Passaste. 

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Meu Espírito foge

Sei que meu Espírito me escapa
À noite segue por escuridões
Mas tudo vê em mundo que não sei

Com quais energias trava contato?
Com quais anjos conversa?
A quais demônios despreza?

Em qual dimensão isso se faz?
Não sei

Só sei que me volta outro
Sempre contente e rico
E me desperta na manhã
Em injustificado contentamento
Com a minhas miseráveis condições
De homem, de carne e de poeta.


domingo, 18 de outubro de 2015

Dos porcos e burros

Para o porco
É dado único destino
Na lama ele terá o seu fim

Para o burro
O fim é um pouco diferente
Com a canga e o capim

E assim dita a natureza
Não adianta perfumar porco
Nem alimentar burro com jasmim.


Desgosto

Desgosto é desgosto
Sofre-se perto dele
Longe dele sofre-se.

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Ciumenta

Olhei para o céu e ela me disse:
"Pare de olhar para a bunda dos anjos!"
Ciumenta, porém muito religiosa!

Belos são os dias

Belos são esses dias que temos em vida
O segredo: não deixe ninguém enfeiá-los.

Amar-te é preciso

Atravesso o Mar das Saudades...
Abraçar-te novamente é preciso
Beijar-te novamente é preciso
Amar-te sempre é preciso
Sem isso, viver não é preciso.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

O Neutrino abunda

O Neutrino, sujeitinho encardido
Calado, amigo tímido dos físicos
Testemunha das atômicas explosões
Que povoa e atravessa o Universo
E que vem dos cafundós até o meu coração
Para o povo, não tinha muita serventia não...
E, pois, o que não faz um Prêmio Nobel, Deus do céu?
Agora ele é mais conhecido (Deus nos acuda!)
Do que a bunda da Popozuda!

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Caixa de engraxate

Às vezes, aventuro-me pelo erudito
Que é a linguagem dos deuses do Olimpo
Chatos e entediados por habitar um lugar
Onde tudo pode ser dito e feito com salamaleques
Mas faço isso de sacanagem
E digo a eles que no Brasil não temos olimpos
Temos morros habitados por gentes mais divertidas
Que, em vez da lira, tangem cavaquinhos
Sopram trombones e castigam pandeiros e tamborins
E falam da bala perdida, da mulher perdida, da vida perdida
E do amor com saudades
Sim, do único amor que é permitido aos mortais
Ah, os deuses ficam com uma inveja danada
E lamentam-se por não saberem batucar um samba
Que aqui se aprende desde menino
Numa simplória caixa de engraxate.

sábado, 26 de setembro de 2015

Alma encantada

Com os pés cansados
De tanta estrada
As mãos rudes e calejadas
De tanta terra revirar
Meu desejo foi sempre descansar
Mas não há descanso
Para quem leva a vida a pelejar
Amor também não quero mais não
Carrego um coração cansado
Com tanta desilusão
Que mais uma não cabe nele não
Assim sigo pelos eitos
Esperando os eitos terminar
Roendo o duro e parco pão
Esperando virar alma encantada
Em rasa cova, em duro chão.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Prelúdio de Primavera

Há uma flor, meu Amor
A ti prometida
E escondida em duro concreto
Ela germina ainda
Pois não é Primavera
Mas há de ser, há de ser...
Pois é isso que vosso coração espera

Há uma flor, meu Amor
Por ti desejada
Nascida em dura terra
De cores psicodélicas
Orvalhada pela loucura de todas as eras
Que explode de sua semente
Pois é isso que teu coração espera

Há uma flor, meu Amor
A enfeitar-te a alma
Concebida contigo
De pétalas que nunca se findam, fenecem
E que te faz em perpétua Primavera
Dá-me esta flor, meu Amor
Pois é isso que meu coração espera.









sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Enxada por fotografia

Conhece enxada por fotografia
Do trabalho tem notícias apenas
Vive nas baladas da burguesia
Ganha bolsa do governo em escola particular
E bate no peito: "sou de esquerda!" - Moleque, vá se catar!

sexta-feira, 31 de julho de 2015

Borboletário

Para a poeta Jana Cruz

Ah esses poetas, essas poetas
Que têm no coração um borboletário
E uma forma de se expressarem
Em voos além do abecedário

Um voo sobre as letras
Um voo sobre a vida
Voa colorida borboleta
Voa sobre a escrita

Venham para este papel
Vou escolher a mais bonita
E depois, devolvê-las aos céus
Pois é lá que a poesia habita. 

Era meu espírito que sonhava

Amanheci no riso, na gargalhada
Devo ter sonhado com coisas boas
Sei lá, não me lembro
Era meu espírito que sonhava
Assim, fazemos boa dupla
De dia, eu me aborreço
À noite, meu espírito se alegra
É que a dimensão dele
É habitada pelo Amor Divino
Pela Verdade, por tudo quanto é Belo.

A pureza da Matemática

Era uma matemática pura
Tímida, corava ao ouvir nomes impróprios
Porém, um dia perdeu sua pureza
E tomou gosto pela geometria dos sólidos
Amando tudo que tivesse cilíndricas formas.

Ordens do carcereiro

Pensava que mandava no mundo
E, hoje, o imundo empreiteiro
Recebe ordens do carcereiro.

Amor traidor

É um traidor
Esse tal de Amor.
Sofre-se por tê-lo
Sofre-se por não tê-lo
Mas, como viver
Sem sê-lo?

Jovem, cuidado

Cuidado, jovem de coração precipitado
Há de se amar nesta vida, é verdade
Saiba, que há mistérios nos olhos de uma mulher
Pode haver um céu neles, ó temerário
Mas lembre-se, o céu é um abismo ao contrário.

Aos futuros penitentes

Queridos futuros habitantes e penitentes desta Terra, nossas desculpas,
Somos nós, que seremos considerados do passado, que vos falam
Quando chegamos esta coisa já andava meio bagunçada
E vos a entregamos pior ainda, porque o desamor por vós era imenso
Apagai pois, todos os sinais de nossa existência. Apagai a nossa memória!

quinta-feira, 23 de julho de 2015

O sorriso da dentadura

Não obstante a prótese de cerâmica nos dentes
O quilo e meio de silicone na bunda e peitos salientes
A plástica sempre renovada em pele flácida
Ela se julgava verdadeiramente moça que não enganava
Confiável, um anjo de 50 e poucos anos forjado na estética.

Quando ouvi Chopin

Quando ouvi Chopin pela primeira vez
Era noite, eu vestia trapos e estava com frio e fome
Meus rotos amigos, meninos órfãos de olhos arregalados
Também ouviam aquela música, em silêncio
Como se escutassem os anjos na hora da morte
Em estranhíssima alegria, narcotizados

E por todo orfanato ecoavam notas que alcançavam o céu
Não éramos mais a escória do mundo
Havia algo sublime na vida, além do sofrimento

Nossos gritos das constantes surras, os horrores
De repente, sumiram naquela sublimação que fluia pela calma melodia
Nossos calos nas mãos descansaram-se do cabo da enxada
E não mais nos incomodavam, tudo nos era leve

As humilhações, as lesões, as misérias todas
Não habitavam mais o nosso mundo
Por alguns minutos, a música nos fez gente
E como foi bom sentir aquilo: ser gente
E nunca mais desejaríamos ser outra coisa.  

Menina baladeira

Menina baladeira
Na sexta-feira, dia de apavorar
Lembre-se moça festeira
Que o mundo nos dá as festas
Para que ele possa se povoar!

Infalível e rápida

A Justiça dos homens é falha e lenta, a Divina é infalível e rápida.

A rainha do Gato Preto

Era moça dada e de volumes arredondados e salientes. A rainha do Gato Preto. Em seu último aniversário, os amigos mais chegados, em sua homenagem, fundaram a confraria "Bunda Popular Nacional". Porém, por uma ação na justiça e ordem do juiz, a alegre confraria teve que mudar o nome para "Traseiro Popular" apenas, porque militantes políticos com dor de dente, encardidos, achavam que o antigo nome era deboche diante de sua nova organização de "esquerda", a "Frente Nacional Popular".

Atração física

Atração física é cola fraca
Pouco junta e se junta
O tempo com a junta acaba.

Curitiba nua

Curitiba és nua, 
Sem asfalto, nesse frio,
Só te cobrem os buracos de rua.

Pendências

Ah, essas paixões pendentes
Que, quando revistas
Revivem a alma da gente!

Faça caminho

Belo dia, manhã esplêndida.
Faça caminho,
Sabedoria e Fortuna são consigo.

Poema para palavras mortas

Tenho pena dessas palavras
Que frequentam os ofícios dos burocratas
Seus requerimentos
Seus memorandos
Seus e-mails que puxam o saco
Do diretor do departamento
Do chefe imediato
Outrossim, mui respeitosamente,
Nesta, atenciosamente
Ilustríssimo, excelência
Despacho, deferimento
E indeferimento…
Há anos que essas palavras
São o meu tormento
Em noites de graves poemas
Elas de mim se acercam
E ficam num cantinho
Com carinha de dó
Esperando vez
Estão cansadas da vida de arquivos
Querem prateleiras de bibliotecas
Olhos esperançosos de moças e moços
Risos de crianças em livros sapecas
São palavras operárias cansadas de viver
Em escritos medonhos, feitas para o trabalho
Mas, vou dar vida novamente a elas
Pois esse é o meu ofício
Ressuscitar palavras
E que triste poeta seria eu
Desalmado mesmo
Se lhes negasse um poema!

Pronome em Brasília

Delatores, dedos-duros,
Proxenetas, rufiões,
Larápios, ladrões:
Vossas Excelências!

Amor Plutão

Há certos amores
Com o comportamento
De Plutão
Longe, muito longe
Eles estão
Corações de gelo
Almas de camaleão
Giram indiferentes
Sem se importarem
Com a escuridão
E só são vivos
Na imaginação.

Taquicardia

Ao te ver, meu coração dispara
Batuca apressado, em taquicardia,
E compõe um sambinha de amor.

Plantemos flores

A cada dia vivendo, ou nada fazendo
Lentos, eu e vós matamos a nós
Pelo menos plantemos flores
Um dia, elas nos serão necessárias.

Canção dos desassossegos

Ao nascer, guardei em mim melodia triste para ouvir depois
Era uma canção que, aos poucos, dei arranjos
Em assobios tortos pelos caminhos que desgosto
E que, em dias de desassossegos
Batuco com os dedos em caixa de fósforo.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

O patinho feioso

Num dia de muito frio
A galinha Hilda acordou atordoada
E sem prestar muita atenção
Fez sua obrigação
Ao chocar mais uma ninhada

Ao final da tarde
O galinheiro ficou agitado
Hilda chocara cinco animais estranhos
E dentre eles um bem feio, mal-acabado

O tempo foi passando
E o galinheiro desconfiado
Se deu conta que Hilda
Por engano, havia chocado patos

Todos riram, era engraçado
Uma galinha sonolenta
Distraída, chocando patos
E um deles, desengonçado
Faltando penas e de bico afilado

Os patos foram engordando
Só o feioso, que mal comia
Sem conseguir firmes bicadas
Até mesmo no milho esmagado
Ficou pálido e magro, esquálido

E numa véspera de festa
A mulher do fazendeiro, Dona Nonó
Levou os patos para a panela
Menos o pato feiinho do bico torto
Que, escondido ficava só, 
Com vergonha de ser tão feio 
Feioso de dar dó.

Na sua cabecinha
O mundo lhe tinha sido ingrato
Como aguentar os risos
Do verde e bonito papagaio
A gozação do garboso pavão
As galhofas do valente galo?


E assim passou-se o Inverno
E no raiar do primeiro Sol de Primavera
Ganhou os céus, num dia lindo
A mais bela águia desta Terra que, como pato
Na fazenda, havia sido criado.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

O porre do mundo

Com tanta desgraça,
o cidadão vive um drama,
como manter-se sóbrio
num mundo que anda 
             Bam
        ba
le          
            an
do,
fora do eixo, ébrio, tonto,
como se tivesse tomado
Um porre de cachaça?!

sexta-feira, 26 de junho de 2015

A rolinha

Ó rolinha, que pelos céus voa
Voa... Voa com cuidado
Todo cuidado é pouco
Com o pastor abestado.

Elogio à mandioca

Mandioca brava ou mansa
Rígida, sapiente, ou fervente
Mandioca que tudo amansa
Até a saudade da presidente.

A bicicleta, o cavalo e a mandioca

Acordou cedo naquele dia. Lavou o rosto, olhou para o espelho e não se viu. Foi ao jardim, deu milho para bicicleta, bom-dia ao cavalo e saudou a mandioca, como uma velha e sumida amiga. Hoje, internada no hospício, não compreende a indiferença da humanidade para com a bicicleta, o cavalo e a mandioca, sapientes seres que alegram a natureza. 

O poder e a loucura

O poder castiga os maus com a loucura. 

Um brinde!

Habeas Copus
Evoé, Bacchus!

O médico e o leitão

Tenho bom coração, pena que o cardiologista não concorde com isso.

II

Estou proibido de comer frituras, mas olho na receita da dieta e não vejo objeção a assados. Pobre leitão!

Rolas e mandiocas

Homens e mulheres sapiens
Seguindo a pé, ônibus ou van
Que por essa vida vã passam
E confessam em certos divãs
Que procuram mandioca brava
Ou, na falta, somente rolas sãs
Atentem para o fim dos tempos
De bunda quente, em febre terçã.

Mulher Sapiens

Há um tempo de plantar a mandioca
Há um tempo de colher a mandioca
Há um tempo de saudar a mandioca
Há um tempo de socar a mandioca. (Livro da Sabedoria da Mulher Sapiens, Cap1, vers. do 1 ao 4.)

O animal e o humano



A paixão visceral
Animal
Nos faz gostar
Do branco
Do Preto
Do violeta
E odiar
O azul
O vermelho
E o amarelo
De paleta
Qualquer


O amor de coração
Humano
Nos faz amar
Todas as cores
Sem rancor
Sem ódio
Porque
Amor de verdade
Ama a totalidade
E não pedaços
A parte das partes.

O cortejo



Se pensas levar a vida numa procissão de rosas em pétalas
Estais enganado, a vida é que nos leva
E no seu insano cortejo vai nos apresentando
Os que vão nos oferecer mortas flores no findar desta tragédia.

domingo, 21 de junho de 2015

Encanta-me

Encantam-me as belezas do mundo
Encanta-me o belo que se vê
Encanta-me você.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Cobra não tem ombro

-- Pai, como as pessoas nascem?
-- No fogo que não queima e na mentira...
-- Como assim?
-- Um dia você vai aprender... É assim:
Homem e mulher... 
Juntando a fome 
Com a vontade de comer. 
O fósforo com a gasolina... 
Mentindo que da cobra é só a cabeça, 
Mas escondendo 
Que cobra não tem ombro,
Só pescoço e muita pressa!

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Enquanto vivo for

Enquanto vivo for
Hei de pensar que o Sol brilha por nós
Em pensamento, não darei a ele outra utilidade
Do que a de iluminar estes terríveis escuros dias
Para que possa te encontrar e dar-te um abraço.

Cães raivosos invadem a cidade



Cães vadios e raivosos
Disfarçados de homens
Andam pelas ruas
Da minha cidade
Da sua cidade
Qualquer cidade

Alguém soltou esses cães
Raivosos cães
Que espumam ódio
Por entre caninos
E pelas ventas
Expelem toda raiva

Raiva contra outros homens
Que não se comportam como cães
Eles têm raiva da liberdade
Do pensamento livre e doutras religiões

Eles têm raiva de tudo
Que não é feito
Combinando com seus focinhos

Na semana passada
Um cão mordeu as imagens
Tão caras aos católicos

Domingo, outro cão feriu
Com uma pedra
A cabeça de uma menina
Que tinha como crime
Não pensar como o cão
E praticar o candomblé

Esses cães são loucos
E dizem roer o osso
De suas únicas verdades

Como esse último cão
Que pensa ser dono de Deus
Mas que em seu coração
Só tem raiva, muita raiva,
Ódio de seus irmãos.

Rapaz de Ponta Grossa



Rapaz de Ponta Grossa,
À toa e só não mais ande,
Só namore moça bonita,
As moças de Campo Grande.


Sei que é muito distante,
Se o rapaz anda cansado,
Só namore moça bonita,
As moças de Campo Largo.

Moça do pé gelado



Moça do pé gelado,
Que nesta terra fria
Procura casamento:
Vais ficar pra titia,
Eis meu juramento!

Frio na carceragem

Minh'alma molenga
Faz-me sentir pena
Dos corruptos
Que experimentam
O avesso do inferno
Presos em Curitiba
Em vigoroso Inverno
Tendo que dormir
Na cárcere sem fogo
Para esquentar uma panela
Só contando com o calor
Da conchinha sem pudor
Com o colega de cela.

domingo, 14 de junho de 2015

Maneta

-- O que não tem a mão?
-- Maneta.
-- O que não tem a perna?
-- Perneta.
-- O que não tem o punho?
-- Pun...
-- Vade capeta! É maneta!

Brancas bundas curitibanas

Curitiba, terra que por engano
Abunda o Sol eterno
Que doira em horas extras
As brancas bundas
Que se farão no Inverno.

Quadrilha no Congresso

-- Onde ocê vai, menino?
-- Vou para Brasília, no Congresso...
-- Pra modo de quê, amardiçoado?
-- Pra ver quadrilha junina, mãinha!

Letras de Domingo

Minhas letras de Domingo
São versos bem vestidos
Que foram à missa e mendigam
Amor entre os homens perdidos.

terça-feira, 9 de junho de 2015

És poeta

Não é preciso ser poeta
Para se sentir poeta
Examina teu coração
Se nele houver sob custódia
Uma antiga flor do campo
Observada pela primeira vez
No alvorecer da infância
Com todas as suas cores e odores
A perfumar tuas lembranças
Foste e és um poeta a vida toda.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Frio curitibano

No frio curitibano
Que a tudo enferruja
O negócio é ir ao rendez-vous
Imitando coruja.

No frio curitibano
A zona é para o vivente
Que vive acordado sonhando
A boca do buraco quente.

Mas, no frio curitibano
Algo encolhe na Zorba
E nem rezando
A coisa termina em fo...

Alma perfumada

Mocinha de tudo
Tinha a alma perfumada
Até conhecer aquele estropício
Emprenhou, foi largada
Comeu o pão que o diabo amassou
Nunca conheceu o amor
Hoje é dama do meretrício
Triste essa vida né, doutor?

Junho quente

Ao contrário do que se prevê nos calendários
O mês de junho promete ser quente e bom
Porque nele temos fogueiras de São João
Dia de Santo Antônio, salvação das encruadas
E promessas de carícias, presentes da namorada.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Um dia único

Único será este dia
Não terás outro igual
Rogue aos céus
Para que ele seja bom
E tu o faça melhor ainda.

domingo, 17 de maio de 2015

Ensina-me a ler

Ensine-me a ler
Seu corpo, sua alma
Mas, por favor, em Braille.

Manchas de sangue

Maldito seja todo homem
Que vaga pela Terra
Estreitando no peito
Fórmulas do amor divino
Nos livros sagrados
Guardados por suas mãos
Manchadas pelo sangue
De seus semelhantes inocentes.

sábado, 16 de maio de 2015

Vai-e-vem

Amar é um vai-e-vem
Por isso, não dê tanto amor
Ao amor que não se tem.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Afastai-me os dogmáticos

Pai, afastai de mim os dogmáticos
Os homens de um livro só
Incapazes de compreenderem
As mutações do mundo, da própria natureza
E raciocinarem com lógica
Como manda a Ciência
Na impossibilidade disso,
Dai-me paciência
Muita paciência mesmo
Para que eu não apele
E desses tapados corte as orelhas
Como o apóstolo Pedro.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Roupa para terremoto

Cariño, coloca essa roupa não!
Faz frio, pernas e umbigo de fora não!
E adepois, Cariño, diz o douto clérigo do Irã
Que vamos ter terremoto no mundo inteiro...
E sabes que acredito: pois ao te ver, assim, tremo!

quinta-feira, 7 de maio de 2015

A Justiça toma chá

A Justiça nunca morou entre os homens
Como velha e respeitosa tia, ela apenas nos visita
Para um chá; e nos comportamos como bons meninos
Mas, é só a severa anciã virar as costas
E começamos novamente as malcriações.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

A vida é sonho que passa

Feliz daquele que seus sapatos gasta
Correndo atrás do mais belo sonho
Porque esta vida é breve sonho que passa.

Entre o Céu e a Calçada

O Céu de Curitiba tem ciúmes das estrelas
Em escuridão ele as esconde
E somente com um tropeção nas calçadas
É que o vivente pode vê-las!

terça-feira, 5 de maio de 2015

Amantes em Curitiba

Viver em Curitiba requer treino e habilidade
Ao amar em noites frias, por exemplo
Equilibrando uma manta nas costas
Para os amantes em carícias e agonia
Escaparem da gripe ou pneumonia.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Saudade & Esperança

Lembrar do sonho passado
É Saudade
Lembrar do sonho futuro
É Esperança.

sábado, 2 de maio de 2015

Bons-dias todos os dias

Bons são todos os dias
De ruim mesmo só vamos ter um
Viva, pois, este bom dia
Antes de que te arrependas
E o mau dia chegue.

domingo, 26 de abril de 2015

O vendedor de doces

Neste mundo que perde por si o gosto
Parece que o papel do poeta
É vender doces
Para que ninguém se acostume
Com o sabor do amargo.

sábado, 25 de abril de 2015

Armênia

Armênia não era armênia
Tinha esse nome por gosto da mãe
Armênia era boa. Boa Armênia
Quando subia a rua
Com seu vestido feito em casa
Copiado de figurinos, em economia de pano
Os homens do bar, que bebiam a desgraça
A santificavam em elogios profanos
Visão de um anjo caído na favela
Que em sua pernas grossas, em passos miúdos
A todos mostrava o caminho do inferno.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Sonhos em pó

Alguns sonhos nascem doentes
Fraquinhos de dar dó
E por mais que os tratemos
Com sopinhas, remédios, terapias
Em morte súbita, eles viram pó.

Os outros

Passamos a vida discutindo com o projetista
Do que chamamos vida, nossa vida
Com pouco concordamos, 
E desejamos sempre algo diferente 
Do esboço original
Sem meditar, colocamos defeitos em nossos olhos 
Em nosso comportamento
E, principalmente, em inveja 
Discordamos dos excessos dados aos outros
Esquecer os outros, portanto 
É o princípio do contentamento com nós mesmos
Olhar para si, se reconhecer em si 
Nos dá a exata dimensão do que somos.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Brutos deuses

Nem mesmo nos sonhos
Podemos fazer o que desejamos
Há brutos deuses que os governam
Divertindo-se ao tornar tudo pesadelo
Ou, do bom sono de abrupto despertos.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Lembranças em apreço

Não há distâncias
Não há tempo
Nos separando
Daqueles antigos momentos
Cobertos com doçuras
Confeitos de felicidade.

Como beijos de anjos
Em noites de insônia
Tormentos e desenganos
Eles são instantâneos
Em nosso pensamento

Doces, eles têm o apreço das lembranças
E em lealdade ao coração em aperto
Ganham outro nome: Saudade.

Numa manhã de 1500

Numa manhã de abril,
Um índio, um homem
Viu sobre o oceano, no horizonte,
A cruz em brancos panos
E descobriu que os selvagens
Haviam descoberto o Brasil.

terça-feira, 21 de abril de 2015

A boa luta

A luta do homem, a boa luta
É aquela que nos proporciona bom sono
E nos garante o amanhecer de alma tranquila.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Pernilongo dengoso

Descomungado pernilongo
Veio em barulho morfético, anêmico
Sorveu o meu sangue no bico longo
Tomara que tenha pego dengue!

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Plantio em dia de Sol

E o Céu amanhece num azul de sonho
Com rendas de nuvens de claras em neve
Nuvens de não chover, só para fazer bonito

E na barra da saia do Céu, o vermelho encardido
Se arrasta e se mistura com a terra roxa
A mesma que é cavada pela enxada do peão

E o peão é só capricho - tudo limpinho
Sem mato, e cova após cova recebe nua semente
Numa puxadinha de terra daqui e outra dali

E o Sol, que lá do horizonte a tudo olha e espia
É patrão exigente, porque só fará com sua luz crescer
O que é plantado com amor, dedicação e zelo.

Algodão-doce

A tarde, agora calma, depois da tempestade
Se despede das brancas nuvens
Emprestando a elas cores de algodão-doce.

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Não esqueço

Esquecer não esqueço
Dos afetos, dos amigos
No peito, guardo-os com ternura e apreço
Esquecer não esqueço
Dos desafetos, dos inimigos
Nas mãos, guardo-os nas contas do Terço.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Porto das Despedidas

Estou no Porto das Despedidas
Meus amigos partem
E me cansam os adeuses
Um dia embarco também
Para descanso de meu braço
Para ceder lugar aos que vêm.

Ninfomaníaca incendiada

Era tão assanhada e dada
Que a ninfomaníaca
Começou a ser chamada
De "Incêndio de Santos":
Fogo no rabo que ninguém apaga!

Malhação de Judas

Poetas malham judas com o chicote das palavras.

Quando o adeus chega

A sereníssima lágrima que cai de teus olhos
É o atestado do adeus esperado
Como a rosa que aguardava da noite o orvalho.

Arrolado

Oficial de Justiça para o matuto: "O senhor foi arrolado como testemunha..."
Matuto para Oficial: "Vosmicê tá querendo uma bifa no pé do ouvido... A..rro...la.. o quê!?".

Paixão de chinelinho

Você descobre que está condenado
E perdidamente apaixonado,
Quando acha bonita, linda mesmo
a tua paixão calçada
Até de chinelinho de dedo.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Inquilinas do adeus

De todas as palavras que conheço
O adeus é a mais forte,
Pois nela moram a tristeza, a saudade e a morte.

Político sem-vergonha

Não, 
A Virtude não é feita de mentiras,
De roubo e corrupção.
Virtude é feita de outra coisa:
Vergonha na cara.

Curitiba, 322 anos

É cinza o vestidinho de festa de Curitiba
Já chegaram as nuvens
E daqui a pouco a chuva para os parabéns.

II

Curitiba completa hoje 322 anos.
Daí você grita pela janela: "Bom-dia, Curitiba!"
E um eco responde: "Bom-dia, por quê?!"

Humor sempre

Humor não tem limites,
o que tem limites
é a falta de humor.

Oração da noite

Senhor, a todos dai a luz que não se apaga
E um salário que suba tanto quanto a tarifa elétrica da Dilma.
Amém

segunda-feira, 30 de março de 2015

Nos Campos de Guarapuava

Nos Campos de Guarapuava
Nas sesmarias que restaram
Ainda ecoam selvagens gritos
Dos Kaigangs que ali tombaram
E nos restos da Fortaleza do Carmo
Nada lembra Nossa Senhora
Que por certo, naquele sertão
Ao ver o sofrimento d'outros escravos
Chorou todas suas lágrimas
Nas cristalinas águas do Jordão.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Até jaz

Herberto Helder - (23/11/1930 - 23/03/2015)


Adivinho quando morre um poeta
O silêncio come a noite
Os pássaros não voam
Pois não há vento

Sei quando um poeta baixa à terra
Em respeito, as árvores viram estacas com cabeleiras lunadas
Nada se move
Nada se mexe, anda ou rasteja
Pois, morreu o poeta

Foi assim no encantamento de Vinícius
Com certeza foi assim com Pessoa
Com Ovídio, Camões, Catulo
Grande, minúsculo, tanto faz
O poeta na cova agora jaz
Muito puto no prelo de suas próprias indagações
Assobiadas nas canções do seu próprio tempo, sempre impróprio
Pois foi curto sempre.

Fervente

Era chamada de Sal de Fruta
Pois até na água fria
No amor, a danada fervia.

Quaresma

Respeito a Quaresma,
Não como carne...
Nem galinha.

Injusta vida

A vida é feita injustiças,
uns têm conta no bar,
outros na Suíça.

Culpas para toda vida

Meus amigos,
Não carreguem consigo
Pelo resto da vida
A culpa de ter condenado
Em vez de ter educado,
Matado
Em vez de ter preservado a vida,
Feito a injustiça, iludidos
Ao tentar fazer a justiça.

Charlatães da modernidade

Neste melancólico início de século, ganhamos velocidade, técnica e as facilidades decorrentes. Mas, não avançamos um milímetro para decifrarmos a mais antiga angústia: a de se fazer vivente com morte anunciada. Por não resolvermos o essencial problema, os charlatães e aproveitadores de todos os tipos aparecem e nos prescrevem fórmulas mágicas de unguentos para relaxar espíritos. Induzem-nos com propaganda, ideologia, religião salvadora e com todas as verdades absolutas deste mundo roto e travestido com a roupa da prosperidade. Mas essas fórmulas têm prazo de validade curtíssimo e funcionarão bem até que o primeiro infortúnio nos subtraia da catalepsia induzida.

O ateu solitário


Solitário e ateu,
Quando recebia 
Aos sábados
Pela manhã
Testemunhas de Jeová,
Mandava-os entrar,
Fazia-os sentar
E os servia: 
Café e chá
Com bolacha Maria.

Woodstock

Era uma outra era
Em que uma flor de laranjeira
Enfeitava teus cabelos
E acreditávamos
Na revolução de Aquário
Na Paz
No amor
Que nunca se fizeram.

Cegueira de poeta

Na sempre nublada Curitiba surrealista
Poeta que diz namorar a Lua e as estrelas
Precisa urgentemente de exame de vista.

Carrancas

O que seria de mim
Ao enfrentar as carrancas da vida
Sem a suavidade de teu sorriso?

A vida que gera a morte

Não. Não descartaste um feto,
Deste a ele a mais desumana morte
Sem possibilidade alguma de defesa.
És livre dele, viva.
E ele é vida abortada: morto.

Janeiras Afonsinas





Janeiro veio
Janeiro vai:
feliz daquele
que dele sai.

Janeiro veio
Janeiro foi:
feliz daquele
que tem seu boi.

Janeiro veio,
Janeiro, ó dó:
triste daquele
que vive só.

Janeiro veio,
Janeiro vai:
feliz daquele
que tem seu pai!

segunda-feira, 23 de março de 2015

Outono triste

Outono,
Melancólica estação.
São dias que choram
E que se escurecem.
É a manha do mundo
Para se demonstrar,
Como tudo,
Triste também.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Vivei

Vai minha amiga,
Vai meu irmão, 
Vivei. 
É tempo de viver 
E vós sois nele.

domingo, 15 de março de 2015

Emplasto

Saudade vem de uma topada d'alma
Em aguda dor, que se deu na vida
Que nem emplasto Brás Cubas cura.

Imortal e divino

Todo amor tem em si
Algo de imortal e divino
Fora disso, sobra-nos
O que nos faz feras.

sábado, 14 de março de 2015

A Santa Mãe que me socorre

Desde menino adotei mãe alheia.
A minha, a de verdade, não conheci.
Mas, deu-me o mundo mãe postiça,
Divina e linda como todas as mães.
Dela também nunca vi o rosto,
Um retratinho amarelado sequer.
Ela acompanha-me o tempo inteiro
E sem descer do altar, ou dos céus,
Perdoa-me os desatinos, as revoltas,
O que foi feito de ruim e o não feito.
Mesmo ao resvalar pelos abismos
Encontro suas mãos em socorro
E faz-me guiar seus outros filhos
Órfãos que dela têm se socorrido,
Desvalidos sem norte ou abrigo,
Gente que por este mundo anda
A procura de paz e alento.

terça-feira, 10 de março de 2015

Adeuses & Saudades

Somos feitos de adeuses e saudades.
Na vida, engana-se quem pensa estar chegando.
Da vida estamos sempre de saída.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Os nomes da morte

Num tempo que já vai distante
E de fingido respeito
Chamava-se "passamento" 
A morte de algum sujeito
E nas rádios, depois da Hora do Angelus
Debulhavam-se lágrimas 
E votos de pesar à família enlutada
Pelo branco e maquiado defunto 
Que tinha passado desta para melhor
E que agora estava em câmara ardente
No próprio e derradeiro velório

Enquanto as beatas na sala fofocavam:
"O desgraçado deu adeus ao mundo!"

O padre arrematava: 
"Entregou a alma a Deus"

A viúva em suspiros já tinha saudades: 
"Apagou a vela de vez!"

Os bêbados, que nem conheciam o morto, diziam em coro:
"Foi para o beleléu"
"Bateu as botas"
"Foi para a cidade dos pés juntos"
"Esticou as canelas"
"Foi comer capim pela raiz"
"Empacotou"
"Vestiu o pijama de madeira"
"Foi para o além"
"Virou presunto!"

A sogra comemorava:
"Foi bom, parou de sofrer, já estava na hora extra!"

E num canto, um chifrudo do defunto, com despeito, em rogo praguejava: 
"Bem feito, entregou a alma pro diabo!".

Amortecido

Uma nova paixão
Amor
Tece.

quarta-feira, 4 de março de 2015

Morte, a democrata

Democrática Morte
Que aceitas entre os teus
O pobre e o abastado
O avarento e o pródigo
O saudável e o lazarento
O demente e o normal
Sem distinção de raça
Cor, sexo, ou origem social.

***

Democrática Muerte
Que aceptas entre los tuyos
Al pobre y al rico
Al avaro y al pródigo
Al saludable y al leproso
Al demente y al normal
Sin distinción de raza
Color, sexo, u origen social.

(Versão para o espanhol de Félix Coronel)

sábado, 28 de fevereiro de 2015

Matuto cismado

Sou matuto cismado,
Desses cabras que conversam em voz alta com a cisma,
Sem da cisma esperar qualquer resposta.
Pela manhã, cedinho, com o Sol quase desperto,
Sigo o caminho da roça a cismar pelos matos adentro.
E pergunto ao meu bom Deus, por que no mundo tem tanta criatura
Sem atinar da felicidade que sinto ao beber da água do ribeirão?
A felicidade
De quando sinto na cara o vento,
De quando sinto crescer os calos nas mãos,
De quando sinto a terra que se revira contente para dar vida à semente?
E Deus, que deve ter cismas mais importantes, não responde nada não.
Já à tardinha, com o Sol mortinho,
Encosto a enxada no eito
E trago a viola pro peito
Pra esquecer as cismas do cansado dia
E procuro nas cordas soltas
O canto que pode ser alegre ou triste
Dependendo do entendimento
Que tive daquilo que não sei nada não.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

A encomenda

T. S. Eliot, poeta, Nobel de Literatura de 1948
"A vida é longa demais"
Disse Eliot
Talvez sim, no tempo do poeta
Em que a velocidade
Era menina de berço
E de gatinhas se arrastava

A vida é curta demais, digo
Tão rápida hoje
Que já se nasce
Com cova sob encomenda
Em cubículos no cemitério.

Paixão em águas profundas

Júlio Pomar, “Mulheres na Praia”, 1950, óleo s/ tela
Paixão
É nau com naufrágio anunciado
Em águas profundas para riso de Netuno
Porém, 
Capitão, ela é inevitável
Vá fundo! 
Como descobrir as mansas águas do amor
Ao se largar do barco da paixão o remo?

A geometria do torto

Poema não carece de régua e compasso
Para dizer e marcar o que há de direito no torto
Sua geometria é feita nas curvas dos sonhos
Nas infinitas retas que juntam teu coração ao meu

Sua natural assimetria diz que cada criatura é diferente
No sentimento que se carrega nesta terra penitente

Um poema é feito por poeta criança que desenha
Uma manhã ensolarada generosa em esperança
Que pode ser clara, doce, boa e bela
Para as almas inundadas de amor e compaixão

Mas que pode ser o prenúncio do inferno diário
Para as almas amargas que nada mais esperam
E vagam na devassidão do ódio
Em perpétuo e penoso calvário. 

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Coração andarilho

Sou miserável poeta
Tudo que tenho porto comigo

Calço velhos sapatos contentes
Para gastar mundo
E escondo no bolso
Caixinha de lembranças
Onde guardo sonhos

Carrego nos cansados braços
Uma lira de orvalho
Para cantar os encantamentos 
Dessas paisagens
Dessas frescas manhãs
Em esperanças
Dessas mornas tardes
Em labutas tantas
Dessas noites artesãs 
Das cismas dos viventes

Tanjo a lira para poemar a magia
Que sai do meu coração
Em ornato ao que é simples
Em admiração pelo que vive.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

O nome do acaso

São tantos os mundos dentro doutros mundos
Que na falta de melhor explicação
Dizemos que eles são fruto do acaso
E o acaso é o nome de nossa ignorância.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Ventos de Maringá

Ao Joubert de Carvalho, in memoriam

O vento me trouxe de longe
Os aromas do café torrado
Nas quentes tardes de Maringá
E a saudade na música de Joubert
Da cabocla que garrei a maginá.

Para ser livre

Os livres
Leem
Os livros.

Borduna no graxista

Ó mau poeta graxista
Que desejas
As sedutoras tetas
Da fama e fortuna
E que usas da lira
Para alisar e dar brilho
A biografias de pulhas
Ladrões ordinários
Famosos por nada

Dos honestos 
És a patrulha

És um farsante
De marca barbante
E mereces na cabeça
Uma borduna!

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Milho para bicicleta

É tamanha a insânia em que vivemos e tal
Que qualquer pessoa dita correta
Não está livre de acordar no seu quintal
Dando milho para bicicleta.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

O sono do anjo cego

O viver nesses insanos dias
Obscenamente intolerantes, medonhos
Obriga-nos a desejar dos ignorantes
A capacidade de fechar os olhos
E sobre tábuas de pregos
Com a cabeça num travesseiro de pedra
Dormir tranquilo como um anjo cego.

Divinos infinitos

No andar pelas noites
Há de se notar a paisagem
Das imensidões pontilhadas no céu
Para se ter a noção exata do próprio tamanho

Há de se saber que nos é dado como criaturas
Em humildade de coração
Poder apenas guardar
Nesses nossos pequenos olhos
Grandiosidades, divinos infinitos
E todas as luzes da criação.

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Oração para velório de corrupto

Vendeste tua alma, ó infeliz
Saibas que é para sempre
Para isso não há resgate
Serás vazio eternamente
E teu vil bolso cheio
Jamais comprará para ti
A paz das almas dos inocentes
Que roubaste, que mataste
Em tua corrupta vida, pois é maldito
O dia em que tu nasceste.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Para se saber vivo

O amor te faz vivo
É o atestado de vida de tua alma
Sem o amor e a capacidade de senti-lo
És apenas uma carcaça que respira.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

A escola no jardim

Existiu uma escola sem carteiras, sem TV, sem computadores, sem paredes e até mesmo sem quadro e giz. Mas ninguém reclamava, pois os alunos aprendiam com alegria, seguindo pelo jardim o grande mestre Aristóteles, que ensinava somente uma coisa: pensar.

Para o conforto da alma

Duas coisas que um homem nunca deve se esquecer: a bondade que lhe fizeram e a maldade que ele fez. A primeira para conforto de sua alma e a segunda para repará-la praticando o bem.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Canga de peão

Nunca se acostume 
Com essa sina e cangalha de peão
De trabalhar por castigo, 
Juntando dinheiro para patrão
E de guardar somente o domingo 
Para esfriar os calos das mãos.

domingo, 25 de janeiro de 2015

Humano destino

Guarda en tu corazón
Por lo menos un día en que haya valido la pena vivir
Recuérdate siempre de él, olvídate de las monotonías
Porque recordar es el humano destino
Y aún en infelicidad, podemos en el pensamiento
Recordar la antigua felicidad, y en ella revivir.

(Versão para o espanhol de Félix Coronel)

Versos natimortos

Tenho saudades
Dos meus versos que se perderam
E foram tantos que nem sei
Alguns, natimortos, não ganharam papel
Não se vestiram do azul eterno
Porque não trajavam a casaca da academia
Nasceram, deram um suspiro, e seguiram
Eram noturnos versos
Gestados no mistério das estrelas
Viajantes em infindáveis espaços, etéreos
Hoje vão adiante, procuram poeta atencioso
De boa memória e que não os julgue bobos
Ao falarem de coisas simples
Como o arvoredo que canta na brisa
Como o amor empenado que não desempena
Como a vida, que é só isso, vida apenas.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Lembrar é humana sina

Guarde em teu coração
Pelo menos um dia que valeu a pena viver
Lembre-se sempre dele, esqueça as monotonias
Porque lembrar é a humana sina
E mesmo em infelicidade, podemos no pensamento
A antiga felicidade recordar e nela revivermos.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Impudicas senhoras

Impudicas e flanantes senhoras
Que ao desfilarem calçada afora
Esfriam a quentura que vai dentro
No vento que deixa a bunda de fora!

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Corredor da morte

Sim, temos nossa pena de morte
Para os aflitos nas filas do SUS
Ou largados nos corredores dos hospitais
Que outra pena precisamos mais?

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Fiat Lux

Havia trevas sobre a face do abismo
E Deus disse: "Fiat Lux"
E o homem inventou a tarifa elétrica
Uma companhia de fósforos
Os automóveis da Fiat
E o sabonete Lux para lavar sua alma.

domingo, 18 de janeiro de 2015

As árvores da Rua das Flores

Vejo as árvores da Rua das Flores
Quando menino, eram tão fracas, raquíticas
Hoje são enormes, tão fortes
Sombreiam meus passos
E escondem o antigo relógio
Mas não o tempo que me escapou.

Volume morto

Nas desilusões do amor
Pode ser que se esgotem todas as lágrimas
Mas, sempre é possível usar o volume morto.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Meditações sanitárias I

De nada adianta
O mármore no banheiro,
Se da obra obrada
Sempre se tem
O mesmo cheiro!

O soneto adormecido

Dois passarinhos cantam na janela
E o poeta tira as palavras para dançar
Em três versos de passos curtos, um haikai
Mas quando se juntam ao dueto outros pássaros
Na sinfonia para acordar a manhã
Ele dança abraçado aos versos alexandrinos
E traz à vida velho soneto de há muito adormecido.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Planetas perdidos

Procurou o amor verdadeiro a vida inteira
E hoje, ao ver o relatório da Nasa
Descobriu que nos planetas perdidos
Certamente, seu amor lá se encontrava.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Deus não tem religião

Deus não está só em tédio nos céus
E não é esta falsa divindade de intolerância das crenças
Pensando bem, Deus nem tem religião
Deus está agora do teu lado e se faz amor no teu coração
É Ele que te abraça como abraça a Terra o Universo todo
Deus é piedade, é alívio das humanas dores, é comiseração.

Com o tempo que tenho agora

Com o tempo que tenho agora
Faço o que tem que ser feito
Pois essa vida guarda um defeito
Acabar sem nos avisar a hora.


Con el tiempo que tengo ahora

Con el tiempo que tengo ahora
Hago lo que tiene que ser hecho
Pues esta vida tiene un defecto
Acabar sin avisarnos la hora.

(Versão para o espanhol de Félix Coronel)

domingo, 11 de janeiro de 2015

Carro de boi

Meus sonhos viajam de carro de boi
Lentos vão, são poeira, na estrada são
Velhos bois tangidos por antigo menino
Que nunca deixou de sonhar não.

Estou de saudade nova

Estou de saudade nova
Soube disso no aeroporto
Quando senti minha alma
Ganhando asas junto a ti.

Sob o Sol, no cabo da enxada

Quem já puxou um cabo de enxada
Ombro a ombro com irmãos iguais a si
E sob o Sol, do duro eito tirou todas as riquezas
Sabe que a honestidade para o povo brasileiro é regra
E que roubo é coisa de vagabundo que deve ser preso.

sábado, 10 de janeiro de 2015

As estrelas do Hubble

Os olhos do homem que estão nos céus
A nós descortinam velhos mundos
Meu Deus, quantos planetas novos
Quantas galáxias no balé sobre o vácuo
Quantas estrelas para namorar!

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Quadrinhas curitibanas I


Uhuhu faz o trem
Buá faz o nenem
Toda cidade tem prefeito
Só Curitiba não tem.

II
Curitiba não tem único rio limpo
E todos seus lagos estão sujos
São as águas de banho dos políticos
Sujeira do roubo dos ditos cujos.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Noite boa

Cordialmente disse
Meu boa-noite
Para a boa da noite.

O jumento eleito

Por ser jumento
Que não dava coice
Nem azurrava
As ovelhas do aprisco
Num só balido
Fizeram dele prefeito.

domingo, 4 de janeiro de 2015

A passista

Escuto aquele samba antigo
E sei que ainda és a mais bonita
Que desfila pela minha saudade.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Vento do Novo Ano

Há um vento
Que sopra pela minha janela
Veio da madrugada 
E do teu coração em festa
Tem tua voz e sussurra-me 
A paz que pediste em prece.