quinta-feira, 23 de julho de 2015

Quando ouvi Chopin

Quando ouvi Chopin pela primeira vez
Era noite, eu vestia trapos e estava com frio e fome
Meus rotos amigos, meninos órfãos de olhos arregalados
Também ouviam aquela música, em silêncio
Como se escutassem os anjos na hora da morte
Em estranhíssima alegria, narcotizados

E por todo orfanato ecoavam notas que alcançavam o céu
Não éramos mais a escória do mundo
Havia algo sublime na vida, além do sofrimento

Nossos gritos das constantes surras, os horrores
De repente, sumiram naquela sublimação que fluia pela calma melodia
Nossos calos nas mãos descansaram-se do cabo da enxada
E não mais nos incomodavam, tudo nos era leve

As humilhações, as lesões, as misérias todas
Não habitavam mais o nosso mundo
Por alguns minutos, a música nos fez gente
E como foi bom sentir aquilo: ser gente
E nunca mais desejaríamos ser outra coisa.  

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