quinta-feira, 10 de março de 2011

A taquígrafa

Era modesta taquígrafa
Nas ventanias dos tribunais
E ao anotar as longas falas
Das testemunhas arroladas
Em processos de morte,
Lamentava secretamente
Não poder em tinta descrever
O que lhe ia entre os dentes,
Entre a garganta e o ventre,
As ignomínias que engolia.

Ali, perante togados,
Escrevia de olhos fechados
Quando uma ré chorava
E no choro revelava
Que matara por amor...
E depois tentara suicídio
Tomando formicida.

E de tanto escutar aquilo
Em tantas histórias iguais,
Inventou novo símbolo
Para o nome dos réus
Homicidas do amor:
Uma bolinha com patinhas
A imitar doida formiga.

E para as vítimas amadas e mortas,
Desenhava uma gota d'água
Simplória como uma lágrima
De quem ousou amar na vida.

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