quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Sol, mãos ao alto!

Rouba os raios do Sol
Na manhã que nasce
Como se não existissem
Outros amanhãs,
Pois este amanhecer é único
Assim como únicos são teus dias

Não caia na habitual mentira
De que tudo é igual
Em torturante rotina
A repetição está no relógio
Coisa mecânica,  coisa sem sangue,
Tua vida não se repete
Tudo é novo a cada instante

Rouba os raios do Sol
E ensina a outros a também roubá-los
A este furto Deus nunca castiga
Porque não é pecado
Desejar luz nesta caminhada

Rouba e os guarda no coração
Para iluminar outras almas
Para dar alento e luz para quem precisa
E que normalmente ignoramos
Porque no escuro quase sempre andamos
E assim não notamos quem está ao lado.


quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Quando os ipês florescem


Foi exatamente no dia em que os ipês floresceram. Lembro-me, doutor, que as ruas estavam ladeadas por colunas amarelas e as pessoas nem se davam conta – quanta gente abestada, meu Deus! Creio que para boa parte das gentes, as paisagens não passam de pano de fundo para continuidade mecânica intercalada no intervalo que vai do nascer ao morrer. Entre um ipê e outro ipê, entre um passo e outro passo, ignoramos o relógio natural a marcar brevidades.

Perdoe-me a ansiedade, mas destas coisas que lhe digo e me custam memória, assustadora foi a que veio. De repente aquela vontade de caminhar. Enforcar o trabalho. Ignorar agendas. Não pensar em nada além de minha própria vontade de caminhar. Joguei o telefone celular fora. Desci a rua de casa, parei um pouco na banca de jornal e pela primeira vez, em anos, não tive interesse nas manchetes. Continuei a andar. Respirava fundo: brincava de guardar o ar nos pulmões pelo máximo tempo possível. Coisa de criança, sei disso, doutor. Mas que prazer me fazer criança assim, respirando apenas. Certo, fiquei tonto. Mas não liguei. Continuei caminho e guardando ar.

Perambulei por horas. Dei conta disso pela quantidade de suor em minha camisa. Resolvi tirá-la e descalçar os sapatos. Assim, sem querer chegar, cheguei a um bairro no qual nunca antes estivera. As pessoas eram-me estranhas e nas ruas já não havia um único amarelo dos ipês. Aliás, eu não via por ali árvore alguma, verde algum. Apenas gente e concreto. Fiquei um pouco preocupado. Em que raio de lugar, afinal, estaria? Mas, resolvi continuar, meus pés me obrigavam a isso. As preocupações se dissipam no andar depressa e aparentemente sem rumo. Tenho essa crença, sim senhor.

Ao longe avistei uma longa fila. Todos aguardavam entrar num prédio velho e acho que abandonado. Perguntei ao último da fila a razão daquilo. O homem, de rosto cúbico e olhos sem vida, nada disse. Ignorou-me. E a mesma coisa se repetiu com mais três ou quatro seres geométricos aos quais repeti a pergunta. Nada.

O senhor sabe, doutor, a curiosidade é a pá do coveiro e move o mundo. Eram centenas de pessoas sectárias da ordem e silêncio a fitar nucas. Seguíamos rápido, logo entrei no prédio. O contraste da luminosidade me deixou cego por alguns segundos. Na rua, há pouco, o sol brilhava. Meio-dia talvez? Demorei um pouco para me acostumar com a penumbra e, instintivamente, segui a nuca da pessoa que estava na minha frente.

O corredor marrom-cinza fazia-se estreito. O ar era pesado e viciado. Um cheiro de mofo ardia nas narinas. Ninguém falava nada. As pessoas fitavam nucas como se estivessem olhando para uma parede de chumbo. Emoção nenhuma. Transe puro. O corredor ficava cada vez mais escuro. Estreito. Mas logo chegamos a uma sala enorme. Sem janelas. De contato com o mundo exterior somente aquele túnel mofento pelo qual havíamos chegado ali. Mofo. Calor. Centenas de pessoas esperando. Esperei. Mesmo porque não dava para voltar. Esperei.

Depois de algumas horas, minutos, sei lá - pois os escuros guardam o estranho costume de esconder o tempo -, uma moça puxou-me pelo braço. Esforcei-me para ver o seu rosto. Parecia-me familiar. Morena, talvez. Bonita, talvez. Talvez a minha corretora de seguro. Senhorita pudica por inteiro. Ou a vagabunda do puteiro Real. Sei não. Dei-lhe o braço e fui guiado para o canto oposto ao que estávamos. Entramos depois numa espécie de porão estreito. O cheiro de mofo aumentava junto com a escuridão. Ela agora andava abraçada a minha cintura e me direcionava pelo labirinto. A certa altura paramos. Num tempo, que de tão breve não se conta e que de tão eterno não se esquece, ela beijou-me. Tirou a roupa. Abraçou-me. Desapareceu. Mudo e tonto, levei algum tempo para me recuperar do susto e do prazer inesperado. Refeito, tornei-me desespero. Precisava sair dali. Comecei a correr pelos escuros até encontrar uma portinhola. Ganhei a rua e vi que não era a mesma rua pela qual havia entrado no prédio. Olhei para o Sol: cego, respirei em alívio e tornei a caminhar sem rumo.

Neste ano, doutor, dois passados após esses acontecimentos, os ipês floresceram antes da época. Ainda estamos no inverno e as ruas são escorregadias com tantas flores espalhadas pelo vento. Não me julgue leso somente porque uma vez por semana entro na fila do prédio do corredor mofado. Espero. Há de se encontrar prazer nisso. É a espera que nos faz vivos.

O homem da cara cúbica é meu amigo. Pelo menos assim eu acho, pois no seu olhar, sempre a guardar a nuca da frente, brilhou a vontade de um dia conversarmos. A moça? Sim, doutor, nunca mais encontrei-me com aquela moça que talvez fosse morena. Encontro nesses dias outras mulheres. Todas parecidas com alguém que conheci em minha vida. Mãe, minhas irmãs, colegas de escola, antigas namoradas, freiras do colégio... Entretanto, não são quem imagino que sejam. Porém, na dúvida, jamais permito que elas repitam o beijo, ou ainda se dispam, como fez aquela moça que talvez fosse pudica ou vagabunda. Não sou dado a incestos, sacrilégios. A fidelidade faz parte do meu caráter.

O mofo já não me incomoda. Treinei muito para não respirar durante a travessia pelos corredores do prédio. Passo tempo sem inalar um único grama de ar. Doutor, sinto que os ipês aprovam esta dose extra de oxigênio que lhes ofereço. Agradecidos, eles me dão em troca flores fora de época e, em exuberâncias, me fazem menos penoso este caminho quiçá finado em longa espera.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Segunda-feira cínica

Segunda-feira cínica, trânsito pesado,
Motoristas com cara de dor dente,
Olho a cínica paisagem da cidade:
Prédios, lixo, favelas, indigentes, alienações.
Quanto cinismo pode haver num homem
Para que ele aceite tais aberrações
E ainda dê a isso o nome de vida?

domingo, 26 de agosto de 2012

A piedade de tuas mãos

Tuas mãos em cirurgia de urgência
Tiraram-me do peito o coração
E ao recortá-lo fizeram-me susto
Pois dele saíram coisas ocultas
Fingidamente esquecidas
E nos meus lábios mudas.

Tuas mãos, que poder têm as tuas mãos,
Deus meu!
Finas, cativantes e ágeis te explicavam
Em cada lembrança infantil,
Roubando manga,
Pulando muro,
Nadando no rio. 

Enquanto a noite se adiantava
Em frio, em escuridões.
Tuas mãos, que pintam tua alma
Em delicadeza na tela de quem vive,
Por que quiseram também pintar
Os antigos temores, em piedade,
Deste agoniado peito meu?


sábado, 25 de agosto de 2012

Armstrong pisou meus sonhos

Aos seis anos de idade
O mundo se forra de heróis
E assim fica dividido
Entre mocinhos e bandidos

E foi, em 1969
Com esses mortais
E hoje míopes olhos
Que vi pela TV em P&B
O homem ganhando a Lua
Numa Epopeia difícil
De explicar nesses modernos dias

Foi o primeiro grande feito
Da humanidade cantado
Pela publicidade do rádio
E com imagens instantâneas

Colecionei figurinhas,
Bótons e peças de propaganda
Em que meus heróis
Eram Aldrin e Armstrong
Este o maior de todos
Porque foi o primeiro
Dentre os primeiros
A marcar seus pés fora desse mundo
Que já por aquelas épocas
Claudicava em caduquices

Aos seis anos eu já tinha a cabeça na Lua
Hoje ainda tenho a cabeça além das nuvens
E rendo homenagem a Armstrong
Por ter pisado no solo dos meus sonhos

Hoje, verdadeiramente, Armstrong alcançou as estrelas
Traído por um coração que muito viu
Sem foguete, sem máquinas, apenas por destino
Que é o destino comum a todos os homens
Fado que se cumpre sem companhia
Porque os astros nos pedem em solidão
E sem as glórias dos mortais heróis, dos semideuses.

Aos internautas poéticos

Temerários viajantes em naus elétricas
Não procurei aqui respostas exatas
Exatidões matemáticas, teoremas vivenciais
Receituários de ajudas impossíveis

Procurai sim, aqui, nesses meus versos
A dúvida que santifica o homem
Quando ela se faz apenas rito de fé

Procurai e encontrai aqui
Essa medonha vontade de pelejar
Contra o que já nos venceu
Desde o primeiro berro no berçário
Ao abandonarmos a madre entranha

Procurai e encontrai aqui
Tudo aquilo que nos faz tão humanos
O respirar com algum sentido
Muitos amores perdidos
Inexplicações inexatas
Saudades em toneladas medidas

Procurai, caros marinheiros dos elétrons,
As vossas consciências nessas linhas
E as medi e as comparai com a lira minha
Que é o canto daqueles que na vida teimam
Porque viver é um belo ato de teimosia. 

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Ilustração: Théodore Géricault - A Jangada da Medusa, 1819

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Ramo de arruda

"Menino, vá se benzer!", mandavam-me.

E o benzedor, preto e velho,
Morava numa casa de madeira
Lá no fundo de um enorme quintal
Simples, simples de dar pena.

Na sala, imagens santificadas,
No canto, uma velha moringa,
Água para deixar bento
Tudo que andava errado.

Na mesa, sem toalha, sem comida,
De madeira bruta e desnuda,
Um ramo de arruda
Para tirar quebranto.

E eu, criança de tudo,
Acompanhava com curiosidade
A ladainha que o homem rezava
Ao falar sinceramente com Deus.

E eu, restrito ao silêncio meu,
Buscava lógica naquele ritual
Que me deixava tão bem,
Tão em sintonia com as coisas do Céu.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Na mansão dos mortos

Menina dos olhos vivos
Dá-me um primeiro beijo
E no terceiro
Prometo ressuscitar

Dá-me seu lábios, menina
Porque preciso deste vermelho
Para beijar a vida.







quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Poesia não cansa

Cansado. Terrivelmente cansado
E essa doida vontade de versos,
De versificar as coisas do mundo,
Que em mim nunca se cansa.

Hoje andei por uma estrada vazia,
Que padecia de solidão, de escuridões.
Ligava certamente o vazio que deixei
Ao vazio que com fome me aguardava.

Mas mesmo o vazio, o sem conteúdo,
Ou o sem substância, clamam poesia
Para encherem-se e vomitar o tudo.

Os espaços repudiam o vazio, o nada
E a minha poesia deseja ser o material
A dar densidade aos vácuos profundos.





terça-feira, 21 de agosto de 2012

Olhos sobre a tela

Vieste numa tarde de domingo,
Bela e junto com a florada dos ipês.
Tinhas nos olhos um tempo ido
Como uma velha gravura
Que registra lugares longínquos
Com cores gastas
E traços foscos de nanquim.

Mas, lá no fundo vi em ti
Vontades de reconstruir tua obra
Cobri-la de branco
E enchê-la de cores fortes, em pontos.

Verdade, temos que aproveitar as velhas telas
Pintar até mesmo com os dedos
Em carne viva um outro destino,
Porque a vida se renova
E sempre pede novas paisagens em pano antigo,
Novos rostos, novos gostos, novos desejos,
E flores de ipê que antecipem a Primavera.

domingo, 19 de agosto de 2012

Cachorro velho

Meu velho cão
Envelhece junto comigo
Hoje não mais escuta
Cansou de escutar as bestagens
As coisas que nos amofinam
E de nada valem, conversa fiada
Sem serventia, bobagens

Está quase cego meu velho cão
E as moscas já não mais o incomodam
Não vê, só sente, só lembra
Ao procurar do pensamento o rastro
E Rumina suas lembranças
Como se roesse um osso
Com seus dentes gastos

Meu velho cão
Tem o que os homens não têm
A ausência de revolta
Com o inexplicado da vida
E um baita apreço
Por tudo aquilo
Que envelhece com ele.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Súplica às estrelas

Ouvi, sim, ouvi
Na madrugada esculpida de escuros
O sussurro de tua voz
A evocar velha canção esquecida
Era algo de amor
Era algo de solidão
Sim, ouvi
Tua súplica às estrelas
Enquanto os deuses dormiam.


quinta-feira, 16 de agosto de 2012

O que disseste de meus olhos

Os teus olhos são segredos
Guardados em mares escuros
Abismos cheios de vales
Por onde caminho e me procuro

Tão grande em dissimulações
Há neles uma paisagem
Tão fria, tão calculada,
Que me sinto nela espelhada
Apenas como útil miragem.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Samba da dor

Guardo no peito minha última ilusão
Que hoje é pura dor
E que amanhã não será mais não.

O destino da dor é virar saudade.

Maltrataste a quem te ama
Sei que tu pensas ser feliz
Mas, amanhã não será mais não.

Amanhã, deste amor sentirás vontade.

Morre aqui no peito
Este apego ao que nada vale
Amanhã, esta dor será mais não.

O destino da dor é virar saudade.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Tolices do coração

Às vezes dou ao meu coração
Tarefas impossíveis
Amar a quem não merece
Esquecer a quem não esqueço
E bater, e bater, e bater, sem querer
Por toda uma vida.

Cansado ele batuca, lento ele me embala
E ensaia falsa obediência
Em falsa cadência sem sustos

Meu coração é traição
E trai-me a torto e a direito
(Porque sou triste quando te vejo
E lembro-me que tu és como ele)

Ele sai-me pela boca
E diz coisas tolas
E pelo que eu não fiz
Ele a ti pede perdão.





sábado, 11 de agosto de 2012

Santa Vontade

Vontade
Eis o que move o mundo

O problema é que esta vontade
Geralmente se faz no coração dos maus
E assim
Guerras
Dor
Violência
E descompaixões
São os combustíveis
Dessa vontade que gira sobre o próprio eixo.

Precisamos de novas vontades
De uma Santa Vontade forjada no bem
Do contrário
Nos restarão apenas velhos infernos
Um choro contido, incrédulo
E soluços de pura impotência.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Pecados na manhã

A cidade acorda em preguiça e desdém
Na manhã
Há uma névoa a encobrir os pecados da noite

E um homem, meu Deus, que dorme
Na podridão e nas caixas de papelão desfeitas
Abraçado a um pulguento e doente cão
(Cobertor de ossos e companheiro das andanças
Pelos lixos da cidade em busca de pão)

O Sol aparece e fecha imediatamente seus olhos
De vergonha, revolta e comiseração,
Pelo cão que dorme, pelo homem, Santo Deus,
Por esses pecados que amanhecem todos os dias
E que também são pecados meus.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

A caminho do trabalho

Meu café tem o gosto dos meus dias
Forte, quase sem açúcar e morno.

Abro a porta e vou pelas estradas

Mas antes escuto os passarinhos
Em suas melodias misturadas e próprias

Mas antes vejo a roseira e os beijinhos
Que no orvalho se banham
Como eu nesta manhã banho-me da sorte

Vou pela estrada, livre sigo caminho,
Necessidades desse renascer eterno
E olho no infinito o Sol amanhecer

Penso o que posso nesse dia
E principalmente o que não posso fazer

Não mudarei as manchetes dos jornais
As guerras sempre estarão lá
Em garrafais letras, em horror teatral

E aquele amigo, aquela amiga,
Será que me esqueceram, morreram?
Saudade também vai com o dia meu

Pronto, chego ao trabalho
Escravo, sei que toda poesia deste dia
No caminho ficou e pálida entristeceu.



segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Curiosity está em Marte

Curiosity está em Marte
Procura lá coisas da vida
Na profunda paz dos espaços
E eu aqui neste universo de gente
Nada mais procuro
Pequena me é a curiosidade
Porque do que vi só há desconsolo
Doiradas pílulas que matam o doente.

Curiosity foi deixada numa cratera
Lá há de escalar montanhas
Analisar pedras, a atmosfera
E eu aqui neste universo de solidões
Espero, com sinceridade
Que tal máquina nada encontre
Pois se há em Marte vida
Será vida perdida
Pois toda vida o homem corrompe.

domingo, 5 de agosto de 2012

Camiño

Galega, cariño meu,
Por que me abandonaste
Ao lado da flor que nasce na pedra
Neste ancho camiño
Camiño de Santiago?
Quem há de me apoiar
Nos tropeços, nas dificuldades
Nessa vida de peregrinação
Se no ceo não há estrelas
Se na minha mão
Não tenho a tua mão?

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Retrato do vazio

E tinha lá nos cantos da casa
Coisas esquecidas e amontoadas
Uma rosa ressequida
Um retrato do nada
Tinha lá suas coisinhas
Suas inutilidades guardadas
E um coração vazio
Sem lembranças atadas
Que triste, lento batia
Por obrigação, talvez
Ao sentir que nem mesmo
O gosto do ter tentado
Fazia nele morada.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

A centopeia e a mãe do psicopata

Olho para as crianças brincando no jardim
Uma delas apanha uma indefesa centopeia
E a mutila ao lhe arrancar perninha por perninha
Custo a crer, mas creio enfim que a maldade
No ser humano é algo realmente inato
E a mãe, ocupada em limpar os óculos escuros
Vê aquela cena de explícita tortura
E grita para o pequeno projeto de psicopata:
"Larga isso, menino, é lixo, não coloca na boca!"
Pobre centopeia, torturada, morta e caluniada.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

A minha saudade cavalga

Antigamente, os amantes morriam de saudades
De suas distantes amadas e para vê-las
Suavam sobre longas léguas no lombo dos cavalos

Hoje não temos saudades tão distantes
Tudo está ao alcance dos dedos nos teclados
Sejam dos telefones ou dos computadores

De tal modo que sentir saudades
Assume as feições de uma mera equação matemática
Em que o limite é a velocidade da luz
Ou o movimento dos elétrons em circuitos fechados.

Mas mesmo assim, minha cibernética amada,
Sinto de ti uma saudade das antigas,
Uma saudade que envolve o tato e o gosto na boca,
Daquele esfrega-esfrega quente e cada vez mais quente
Que só é possível na presença de teu de corpo

Chega das carícias elétricas,
Do amor contido em bytes
Minha saudade é cavaleira
E gosta de cavalgar

Eia ô! Eia! Vou pôr o arreio no meu cavalo
Suar por muitas léguas
Só pra te beijar
Assim de pertinho, no abraço e no carinho
Como devem ser os beijos dos enamorados.