quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Última essência

"Oh, meu deus, minha flor de lótus!...
por gratidão vou partir...
Meu desejo é banhar-me diante de ti."
(Fragmento de poema anônimo egípcio, 1.000 a.C.)


Os poetas nasceram antes das línguas
Porque o homem queria entender o sentir
Por isso, há milênios pelejamos descrever
Aquilo que não se descreve
Porque não há palavras novas
Não há expressões certas
Que medem e pesem nossas almas.

E mais mil anos passarão
Outras flores hão de vir
A rosa, a flor de lótus
Na flora do bem, a flor do mal
Espelhos toscos, foscos
Das gentes, do amado
Do sentimento odioso
Do desejo não explicado
Do que não pode ser dimensionado
E que não se submete a esquadros.

E que venham mais mil anos ainda
E que o poeta desenvolva outras línguas
Precisas, quiçá pretensamente exatas
Tudo isso não passará além do nada
Porque a poesia é reticências
É o desejo que não se acaba
Eterna e sempre ao incompleto atada.

E que venham mais mil anos ainda
Um milhão de poemas escritos
Um milhão de amores encontrados
E mesmo assim, embora tenha lutado,
Poeta algum terá decantado
No destilar do seu canto
De amor, do doce sentir,
A última e bela essência
Da alma leve
Em seu coração pesado.

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