Minha amiga foi internada!
Veja que coisa de doidos:
As pessoas não são mais tristes,
Elas sempre estarão
Delicadamente deprimidas;
A melancolia é a novíssima
Mistura de melão com melancia
E o pânico é um medo
Que apareceu ontem
Determinado pela
Organização Mundial de Saúde.
Veja que paraneia:
Os terrores dos homens
A cada dia têm novos nomes
E novíssimos remédios
Determinados por terapeutas
Tão louquinhos
Quanto os desvairados que tratam;
Os laboratórios multinacionais
Gostam deste novo mercado
- Loucura dá muitos trocados! -
Imaginem, ser atacado
Por distúrbios antigos
- Doença boa é doença nova! -
Minha amiga sofria de tristeza!
Louco! Estúpido poeta:
Doideira é coisa de antanho,
O correto, até mesmo na loucura,
É tratar a doidinha, a estúrdia,
Por desajustada social
(Ou, a levemente aluada que da Lua se serve);
Justa é a sociedade
Que nos determina os ajustes
Do que nunca foi justo,
Do que nunca se ajustou
À justiça dos que vivem a acromania
Dessa insana realidade;
Saudável é a sociedade que determina
O injusto código dos manicômios,
Dos hospitais de alienados
E de nossos códices legais.
A dona de minha afeição não quer ganhar na loteria,
Ela quer, na sua suave e sã loucura,
Livre da camisa de força, ser dona da Bayer.
Telúrica, minha amiga conta histórias para os homens selenitas. (Apenas faz estágio na demência!). Conversa com seres pequenos e verdes porque, no ano que vem, vai interromper consultas médicas para vender pílulas de felicidade. Não conte isso para ninguém - a insensatez sensata dessa minha estimada não pode ser compartilhada!
Copyright © 2005 by Fernando Nandé, poesia, literatura, Curitiba-PR Brazil.
segunda-feira, 29 de março de 2010
domingo, 28 de março de 2010
A amargura da doce amiga
Vejo-te amarga, doce amiga,
Os anos te envenenaram.
Os féis do tempo tomaram-te.
Mas ainda guardas uma leve doçura
Na voz em que contas a tua história
(Soprano cantas, piano sussurras...).
Lembro-te na canção de roda,
De vestido rodado a girar,
A girar - a rodar ingênuos dias.
Era menino, tu eras menina
E o amargor passava distante,
Na carruagem da Bela Adormecida.
A maldade estava numa madrasta,
Num lobo que espreitava porquinhos,
Ou no escuro ventre da baleia de Jonas.
E a bondade? A bondade estava em todo lugar,
Nos anões a cantar, no pobre rouxinol chinês,
Na Terezinha de Jesus, eternamente a desabar.
Hoje sabemos que a vida não é um conto de fadas.
Nossas madrinhas tiraram longas férias em terra distante.
Sobraram-nos apenas esses pesadelos em azedume.
Esquece! Vamos brincar de roda, aqui, neste momento.
Giremos: solta tuas belas e bem guardadas tranças,
A inocência não comporta em si amarguras, criança!
Os anos te envenenaram.
Os féis do tempo tomaram-te.
Mas ainda guardas uma leve doçura
Na voz em que contas a tua história
(Soprano cantas, piano sussurras...).
Lembro-te na canção de roda,
De vestido rodado a girar,
A girar - a rodar ingênuos dias.
Era menino, tu eras menina
E o amargor passava distante,
Na carruagem da Bela Adormecida.
A maldade estava numa madrasta,
Num lobo que espreitava porquinhos,
Ou no escuro ventre da baleia de Jonas.
E a bondade? A bondade estava em todo lugar,
Nos anões a cantar, no pobre rouxinol chinês,
Na Terezinha de Jesus, eternamente a desabar.
Hoje sabemos que a vida não é um conto de fadas.
Nossas madrinhas tiraram longas férias em terra distante.
Sobraram-nos apenas esses pesadelos em azedume.
Esquece! Vamos brincar de roda, aqui, neste momento.
Giremos: solta tuas belas e bem guardadas tranças,
A inocência não comporta em si amarguras, criança!
quarta-feira, 24 de março de 2010
Das formigas e moscas
Várias são as coisas risíveis
Naquilo que chamamos
De espírito humano,
Uma delas é essa estupidez
De portar no peito
O germe do fim
E ao mesmo tempo
Essa soberba vontade
De determinar as coisa infinitas:
Formigas que miram o céu,
Moscas que contemplam a eternidade.
Naquilo que chamamos
De espírito humano,
Uma delas é essa estupidez
De portar no peito
O germe do fim
E ao mesmo tempo
Essa soberba vontade
De determinar as coisa infinitas:
Formigas que miram o céu,
Moscas que contemplam a eternidade.
terça-feira, 23 de março de 2010
A liberdade em beleza
Defendo a liberdade do homem,
A liberdade do livre pensar.
Queres dar um rótulo a isso
E sentencias: "sois de esquerda".
Que seja, amigo das etiquetas,
Sei que tu não concebes nada sem marca,
E deseja-me etiquetado e arquivado
Dentro das tuas classificações utilitárias.
Serei, por tua compreensão,
Esquerdo ao sonhar um homem livre?
Há lado mais humano?
Que luta há de ser mais bela?
Dá-me sim este dístico,
Porque a liberdade
Convenceu-me inda menina,
Ao acariaçar um pobre menino,
De sua beleza e fascínio.
E desde lá, a carrego leve,
Em clareza e claridão,
No meu esquerdo
E por demais sinistro coração.
A liberdade do livre pensar.
Queres dar um rótulo a isso
E sentencias: "sois de esquerda".
Que seja, amigo das etiquetas,
Sei que tu não concebes nada sem marca,
E deseja-me etiquetado e arquivado
Dentro das tuas classificações utilitárias.
Serei, por tua compreensão,
Esquerdo ao sonhar um homem livre?
Há lado mais humano?
Que luta há de ser mais bela?
Dá-me sim este dístico,
Porque a liberdade
Convenceu-me inda menina,
Ao acariaçar um pobre menino,
De sua beleza e fascínio.
E desde lá, a carrego leve,
Em clareza e claridão,
No meu esquerdo
E por demais sinistro coração.
domingo, 21 de março de 2010
Desonra (Pecados capitais)
Não vos envergonha,
Caro político larápio,
Caro jornalista venal,
Caro empreiteiro gatuno,
Caro juiz vendido,
Caro funcionário corrupto,
Caro prevaricador usurário,
E caros advogados do infortúnio,
O dinheiro roubado
Que alimenta
Vossas gordas proles,
Vossas festas grosseiras,
Vossas vaidades,
Vossas luxúrias,
Vossas volúpias,
Vossas iras compradas,
Vossas avarezas para com o bem?
Não vos incomoda
O sono em macio travesseiro
Ter condenado à fome e à morte
Milhares de crianças,
Cidadãs brasileiras?
Não vos incomoda
Ver esse povo sem remédio,
Morrendo em filas
Porque o dinheiro
Da Saúde foi roubado
Por Vossas Excelências?
Não vos envergonha
Saber que até o próprio
Berço em que dormem
Seus inocentes filhos e netos
Foi comprado com o desespero,
Suor e sangue de nossa gente?
Não vos incomoda
Que vossos nomes
E de todas as gerações
Que vos seguirão
Estarão manchados
Pelo labéu desses
Torpes pecados?
Não vos incomodam
As quentes chamas
De inexorável inferno,
Que fatalmente
Vos esperam
Por todo o resto da vida
E na morte impreterível
E sempre inadiável?
Não vos incomoda a desonra eterna?
sábado, 20 de março de 2010
O homem na montanha olha para o umbigo
Tenho que colocar ordem em minha vida,
Comprar um pinguim de geladeira,
Subir numa montanha e lá ficar
A ruminar filosofias e outras besteiras.
Deixarei de usar luz elétrica,
A luminosidade da Lua será suficiente.
Jogarei pingue-pongue comigo mesmo
E ganharei de mim, surpreendentemente.
Terei um cão que não come e não late
E cantarei louvores ao pernilongo
Que suga meu sangue empedrado
Pelo frio de um inverno escuro e longo.
Noutro dia, caminharei descalçado no deserto.
Gosto dos meus pés aquecidos
Por grandes andanças e passos perdidos
Neste mundo que por Deus foi olvidado.
Não ouvirei estrelas, delas nada pode ser escutado.
Depois, descansarei nesses infindáveis dias contente
Por meditar naquilo que eu poderia ter sido
Mas que por teimosia sempre tenho desprezado.
Ao morrer, doarei os meus órgãos ao feiticeiro
Para que deles saia alguma mágica desconhecida
Cheia dos caprichos de quem há vivido
A buscar explicações no próprio umbigo.
Comprar um pinguim de geladeira,
Subir numa montanha e lá ficar
A ruminar filosofias e outras besteiras.
Deixarei de usar luz elétrica,
A luminosidade da Lua será suficiente.
Jogarei pingue-pongue comigo mesmo
E ganharei de mim, surpreendentemente.
Terei um cão que não come e não late
E cantarei louvores ao pernilongo
Que suga meu sangue empedrado
Pelo frio de um inverno escuro e longo.
Noutro dia, caminharei descalçado no deserto.
Gosto dos meus pés aquecidos
Por grandes andanças e passos perdidos
Neste mundo que por Deus foi olvidado.
Não ouvirei estrelas, delas nada pode ser escutado.
Depois, descansarei nesses infindáveis dias contente
Por meditar naquilo que eu poderia ter sido
Mas que por teimosia sempre tenho desprezado.
Ao morrer, doarei os meus órgãos ao feiticeiro
Para que deles saia alguma mágica desconhecida
Cheia dos caprichos de quem há vivido
A buscar explicações no próprio umbigo.
Amor físico
Fui atraído pela sua singular matéria
Na razão direta de nossas massas
E na razão inversa do quadrado de nossas distâncias,
Tudo isso multiplicado por uma constante
De atração animal e sexual;
De forma empírica, irracional,
Sem equações e validações matemáticas.
Hoje, estudo a termodinâmica de seus beijos
E a hidrodinâmica de sua boca na minha boca.
Perto de você, as batidas de meu coração
Têm brusca variação na aceleração
E se perdem na velocidade e no tempo.
Já quebrei dois termômetros e um calorímetro
Quando fiquei longe de seus olhos em plasma.
Calor, sentia muito calor. O médico disse ser febre,
Inexplicável e delirante febre de amor carnal.
Ao seu lado sinto-me curado
E temo - e como temo! - que tudo termine
No zero absoluto em que as paixões são extintas,
No zero glacial da total ausência de sua energia vital,
No zero representativo do nada em que nos tornamos
Quando do amor somos ausentes ou em tolice dele desertamos.
Na razão direta de nossas massas
E na razão inversa do quadrado de nossas distâncias,
Tudo isso multiplicado por uma constante
De atração animal e sexual;
De forma empírica, irracional,
Sem equações e validações matemáticas.
Hoje, estudo a termodinâmica de seus beijos
E a hidrodinâmica de sua boca na minha boca.
Perto de você, as batidas de meu coração
Têm brusca variação na aceleração
E se perdem na velocidade e no tempo.
Já quebrei dois termômetros e um calorímetro
Quando fiquei longe de seus olhos em plasma.
Calor, sentia muito calor. O médico disse ser febre,
Inexplicável e delirante febre de amor carnal.
Ao seu lado sinto-me curado
E temo - e como temo! - que tudo termine
No zero absoluto em que as paixões são extintas,
No zero glacial da total ausência de sua energia vital,
No zero representativo do nada em que nos tornamos
Quando do amor somos ausentes ou em tolice dele desertamos.
sexta-feira, 12 de março de 2010
Os anjos da procissão
Na Semana Santa,
Em dia de procissão,
Pendurei-me numa árvore
E, pasmado, acompanhei,
Com os olhos arregalados,
Aquela gente que se arrastava
Curvada sobre os círios,
Pendida por tanto pecado.
Menino demônio,
Invejava as asas tortas
De querubins d'outros meninos,
Que seguiam como frades a procissão,
Ainda com os corações limpinhos
Sem a precisão da faxina do padre.
Inveja tola daqueles anjinhos
De asas feitas de brancas penas de ganso
- ou das galinhas mortas no domingo -
Amarradas com barbante,
Em armaduras de arame,
Pregadas em pobre e falso linho.
Foi quando passou o cantadador
Que em dor a procissão seguia.
Lembrei que ele me havia dito,
Em nossa operária feira,
Que poeta pode voar sempre,
A semana inteira, a vida toda,
Em dia bento, na noite do tempo,
Em dias de pagãs folias festeiras.
Poeta pode falar do Cristo morto,
Do Menino em Belém nascido
E em Nazaré criado e havido;
Chorar na Hora do Angelus, nas Ave-Marias,
Cantar a perene tristeza dos homens
E também as suas efêmeras alegrias.
Para isso seria o bastante
Montar nas asas da poesia
E seguir a procissão dos danados,
Dessa gente que quer a remissão
Dos seus seguidos terríveis pecados.
Perdão para essas pesadas cruzes
Arrastadas em molesta paixão
Pelo mesmo calcário da Via Crúcis
Que levou Jesus, o Cristo, a ser crucificado.
Cristo, o filho e cordeiro de Deus imolado,
Que por nós derramou o seu sangue inocente
Nas pedras do Calvário em que foi fincado.
(Escorreguei da árvore e tive uma queda suave como folha em tarde de outono.
Por certo que, desde aquele tempo, o verso já me amparava na leveza do vento).
Em dia de procissão,
Pendurei-me numa árvore
E, pasmado, acompanhei,
Com os olhos arregalados,
Aquela gente que se arrastava
Curvada sobre os círios,
Pendida por tanto pecado.
Menino demônio,
Invejava as asas tortas
De querubins d'outros meninos,
Que seguiam como frades a procissão,
Ainda com os corações limpinhos
Sem a precisão da faxina do padre.
Inveja tola daqueles anjinhos
De asas feitas de brancas penas de ganso
- ou das galinhas mortas no domingo -
Amarradas com barbante,
Em armaduras de arame,
Pregadas em pobre e falso linho.
Foi quando passou o cantadador
Que em dor a procissão seguia.
Lembrei que ele me havia dito,
Em nossa operária feira,
Que poeta pode voar sempre,
A semana inteira, a vida toda,
Em dia bento, na noite do tempo,
Em dias de pagãs folias festeiras.
Poeta pode falar do Cristo morto,
Do Menino em Belém nascido
E em Nazaré criado e havido;
Chorar na Hora do Angelus, nas Ave-Marias,
Cantar a perene tristeza dos homens
E também as suas efêmeras alegrias.
Para isso seria o bastante
Montar nas asas da poesia
E seguir a procissão dos danados,
Dessa gente que quer a remissão
Dos seus seguidos terríveis pecados.
Perdão para essas pesadas cruzes
Arrastadas em molesta paixão
Pelo mesmo calcário da Via Crúcis
Que levou Jesus, o Cristo, a ser crucificado.
Cristo, o filho e cordeiro de Deus imolado,
Que por nós derramou o seu sangue inocente
Nas pedras do Calvário em que foi fincado.
(Escorreguei da árvore e tive uma queda suave como folha em tarde de outono.
Por certo que, desde aquele tempo, o verso já me amparava na leveza do vento).
Os dias de março
Os dias de março caminham velozes.
Outros marços caminharam velozes,
Mas os marços de infância
São tão lentos, tão lentos
Que custam chegar a minha memória.
Havia neles surpresas de hora em hora
Havia neles brinquedos de criança
Havia neles o desejo de chegar ao agora
Para descobrir que os bons marços
Eram aqueles de outrora.
Outros marços caminharam velozes,
Mas os marços de infância
São tão lentos, tão lentos
Que custam chegar a minha memória.
Havia neles surpresas de hora em hora
Havia neles brinquedos de criança
Havia neles o desejo de chegar ao agora
Para descobrir que os bons marços
Eram aqueles de outrora.
quarta-feira, 10 de março de 2010
O último poema de Safo
É, querida Safo, tua poesia perdeu-se
Por sacanagem dos monges copistas.
Pensavam fazer justiça com as próprias mãos
E condenaram os velhos costumes de Lesbos.
A intolerância deles deixou muito pouco de ti
E um grande legado à imaginação humana:
Como eras, como dirias, como escreverias
Sobre o amor avessado de fêmea para fêmea?
Hei de perguntar a Cronos, ao deixar o mundo dos vivos,
Em que obituário do tempo consta teu último poema
E por que a ignorância tomou-te a pena?
Da segunda pergunta suspeito resposta,
Mas da primeira, como gostaria de lê-lo!
Por sacanagem dos monges copistas.
Pensavam fazer justiça com as próprias mãos
E condenaram os velhos costumes de Lesbos.
A intolerância deles deixou muito pouco de ti
E um grande legado à imaginação humana:
Como eras, como dirias, como escreverias
Sobre o amor avessado de fêmea para fêmea?
Hei de perguntar a Cronos, ao deixar o mundo dos vivos,
Em que obituário do tempo consta teu último poema
E por que a ignorância tomou-te a pena?
Da segunda pergunta suspeito resposta,
Mas da primeira, como gostaria de lê-lo!
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Desconstrutivismo poético
Não apontes para mim!
Não sou adulador dos hipócritas.
Não me peças que a minha poesia
Sirva para reerguer as ruínas
Deste teu podre mundo!
Canto o canto do que se aniquila
E, desprezando todas as claves,
Gravo no pentagrama os agudos
Que compõem a sinfonia
Da universal desconstrução.
Nela estão os gritos
Dos que padecem,
Os graves urros
Dos desesperados
E os calmos e confusos murmúrios
Daqueles que, em vigília,
Oram por perdidas almas.
Não me condenes por ter nascido poeta
Num tempo em que os poetas são anacrônicos.
Por isso,
Não sigo os códices dos profetas
Que falam em nome de Deus.
Contento-me, apenas, em sentir Deus
Na aragem da manhã
E até mesmo na putrefação
Dos cadáveres desses dias defuntos.
Não me condenes por ter nascido poeta
E devoto da verdade, mesmo que nunca encontrada.
Por isso,
Não sigo os líderes da multidão,
Os enganadores e aproveitadores,
Contento-me, apenas, em seguir-me
Guiado por essa antiga e esquecida guia
Que é a liberdade de dizer não.
Não sou adulador dos hipócritas.
Não me peças que a minha poesia
Sirva para reerguer as ruínas
Deste teu podre mundo!
Canto o canto do que se aniquila
E, desprezando todas as claves,
Gravo no pentagrama os agudos
Que compõem a sinfonia
Da universal desconstrução.
Nela estão os gritos
Dos que padecem,
Os graves urros
Dos desesperados
E os calmos e confusos murmúrios
Daqueles que, em vigília,
Oram por perdidas almas.
Não me condenes por ter nascido poeta
Num tempo em que os poetas são anacrônicos.
Por isso,
Não sigo os códices dos profetas
Que falam em nome de Deus.
Contento-me, apenas, em sentir Deus
Na aragem da manhã
E até mesmo na putrefação
Dos cadáveres desses dias defuntos.
Não me condenes por ter nascido poeta
E devoto da verdade, mesmo que nunca encontrada.
Por isso,
Não sigo os líderes da multidão,
Os enganadores e aproveitadores,
Contento-me, apenas, em seguir-me
Guiado por essa antiga e esquecida guia
Que é a liberdade de dizer não.
terça-feira, 9 de março de 2010
O cheiro do fim
Vejo-vos, amigos, mui preocupados
Com a flatulência dos séculos
A consumir a camada de ozônio.
Destino cruel esse da humanidade
Que, ao acalentar sonhos ledos,
Prepara-se para ser exterminada
Pelos próprios e flácidos peidos!
Com a flatulência dos séculos
A consumir a camada de ozônio.
Destino cruel esse da humanidade
Que, ao acalentar sonhos ledos,
Prepara-se para ser exterminada
Pelos próprios e flácidos peidos!
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Suruba atômica
Diz-me que gasto tempo
Ao estudar a ciência dos homens.
Apraz-me, caro amigo,
Ver a suruba dos átomos nas moléculas,
Dos dativos elétrons,
E constatar que nós somos
Um amontoado de células
Que brigam para não envelhecer.
Há muita justiça nisso,
Pobre ou rico,
Ignorante ou erudito,
Todos estão à mercê
Dos distúrbios eletrolíticos.
Ao estudar a ciência dos homens.
Apraz-me, caro amigo,
Ver a suruba dos átomos nas moléculas,
Dos dativos elétrons,
E constatar que nós somos
Um amontoado de células
Que brigam para não envelhecer.
Há muita justiça nisso,
Pobre ou rico,
Ignorante ou erudito,
Todos estão à mercê
Dos distúrbios eletrolíticos.
domingo, 7 de março de 2010
Crueldades celestinas
Nunca mais cuidei das roseiras.
Na realidade, elas dispensaram-me
De tal insano empenho.
As rosas brotam, exuberam-se
E tornam à terra por si,
Sem a necessidade de exéquias, requiem
E lamentos de carpideiras.
Nada será diferente disso
Por maiores que sejam os meus cuidados.
Elas serão sempre reféns do ciclo
Contido na celestina crueldade
Da beleza sucedida pela tragédia.
Na realidade, elas dispensaram-me
De tal insano empenho.
As rosas brotam, exuberam-se
E tornam à terra por si,
Sem a necessidade de exéquias, requiem
E lamentos de carpideiras.
Nada será diferente disso
Por maiores que sejam os meus cuidados.
Elas serão sempre reféns do ciclo
Contido na celestina crueldade
Da beleza sucedida pela tragédia.
sexta-feira, 5 de março de 2010
O olhar do carrasco
- Viver é isso: esperar a morte apenas?
Dizes que não há resposta
E que a porta do compreensível
O vento da noite há de ter fechado.
(Um cão passa e, em comiseração, mija no poste)
Falas de algo que não entendo,
Falas de mim.
Logo a mim que nada falo!
Olhas para meus olhos
Que de há muito deixaram de ver
E uma luz enlaça-me ternamente.
Olhas logo para meus olhos
Vazados pelos punhais em brasa
Desses horrores diários!?
Olhas logo para meus olhos
Que até ontem louvavam a misericórdia
No negro capuz oferecido pelo carrasco
Às suas vítimas antes do definitivo ato?
Olhas logo para essas duas covas rasas
- Lagos constantes de lágrimas -
Cavadas pela pá da descrença
Na minha já mui cansada face?
Não queiras ser enterrada aqui,
Pois é grande a tristeza que há de te cobrir.
Olhos de poeta são os túmulos dos profundos enganos:
Executores que fingem ser belo o que já é putrefacto;
Dissimulados cantantes da manhã que ao nascer já caminha pelo cadafalso do dia;
Carrascos que compõem a canção fúnebre da nossa miserável e mortal condição humana.
(Piedoso, o cão volta e mija no poste; assim, o cão passa a ter sentido para o poste)
Dizes que não há resposta
E que a porta do compreensível
O vento da noite há de ter fechado.
(Um cão passa e, em comiseração, mija no poste)
Falas de algo que não entendo,
Falas de mim.
Logo a mim que nada falo!
Olhas para meus olhos
Que de há muito deixaram de ver
E uma luz enlaça-me ternamente.
Olhas logo para meus olhos
Vazados pelos punhais em brasa
Desses horrores diários!?
Olhas logo para meus olhos
Que até ontem louvavam a misericórdia
No negro capuz oferecido pelo carrasco
Às suas vítimas antes do definitivo ato?
Olhas logo para essas duas covas rasas
- Lagos constantes de lágrimas -
Cavadas pela pá da descrença
Na minha já mui cansada face?
Não queiras ser enterrada aqui,
Pois é grande a tristeza que há de te cobrir.
Olhos de poeta são os túmulos dos profundos enganos:
Executores que fingem ser belo o que já é putrefacto;
Dissimulados cantantes da manhã que ao nascer já caminha pelo cadafalso do dia;
Carrascos que compõem a canção fúnebre da nossa miserável e mortal condição humana.
(Piedoso, o cão volta e mija no poste; assim, o cão passa a ter sentido para o poste)
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